17/10/2016

breathe: capítulo 30


5 de abril de 2014
Dois dias antes do adeus

— Você não come nada há dias. Por favor, Joseph. Pelo menos um pedaço do sanduíche — implorou minha mãe, sentada diante de mim. A voz dela me irritava mais a cada dia. Ela colocou o prato na minha frente e me pediu de novo que comesse.
— Sem fome — respondi, empurrando o prato de volta para ela.
Ela assentiu.
— Eu e seu pai estamos preocupados, Joseph. Você não fala com a gente. Não nos deixa ajudar. Você não pode reprimir as emoções desse jeito. Precisa falar com a gente. Me fala o que você está pensando.
— Você não quer saber o que estou pensando.
— Quero.
— Acredite em mim, não quer.
— Não. Eu quero, querido — ela segurou minha mão, tentando me consolar.
Eu não queria que ela me consolasse.
Queria que ela me deixasse sozinho.
— Tá. Se você não quer falar com a gente, pelo menos fale com seus amigos. Eles ligam e passam aqui todos os dias, e você não trocou nem uma palavra com eles.
— Não tenho nada a dizer.
Levantei da mesa e me virei para sair, mas me detive quando ouvi minha mãe chorar.
— Estou arrasada por te ver assim. Por favor, fale qualquer coisa que estiver pensando.
— O que estou pensando? — virei para ela, minha testa franzida, minha mente nublada. — O que estou pensando é que você estava no volante daquele carro. O que estou pensando é que você saiu de lá ilesa, só com um braço quebrado, porra. O que estou pensando é que a minha família morreu e você estava dirigindo, você... você matou os dois! Você fez isso! Você é a culpada! Você matou minha família! — senti um nó na garganta, minhas mãos fechadas em punho.
Minha mãe chorou ainda mais, seus gemidos ficando cada vez mais altos. Meu pai veio correndo e a abraçou, trazendo-lhe um pouco de consolo. Olhei para ela, percebendo a distância entre nós. Eu sentia que o monstro dentro de mim crescia a cada momento. Eu deveria ter me sentido mal ao ver suas lágrimas caírem e não sentir pena. Eu deveria ter me sentido mal por não querer confortá-la.
Eu simplesmente a odiava.
Eles morreram, e ela era a culpada.
Por causa dela, eu também estava morto.
Eu estava me transformando num monstro, e monstros não precisam consolar
pessoas. Monstros destroem tudo que aparece pela frente.


***

Quando entrei no galpão, bati a porta e tranquei-a.
Merda — gritei, olhando para a escuridão, para as paredes e prateleiras.
As lembranças pressionavam meu corpo, sufocavam minha mente, meu coração. Eu não aguentava mais.
Agarrei uma das prateleiras e arremessei-a para o outro lado do galpão, meu coração tão disparado que eu tinha certeza de que acabaria tendo um infarto. Encostei na parede mais próxima e fechei os olhos, tentando recobrar o controle da minha respiração e das batidas do meu coração, que parecia ter sido tirado de mim.
Escutei uma batida na porta.
Eu não iria abrir.
Eu não podia abrir.
Eu poderia ter acabado com ele. Eu poderia ter acabado com ele. Me perdoa. Me perdoa.
Eu sabia que Demi iria tentar me trazer de volta, me tirar da escuridão. Ela iria tentar me salvar de mim mesmo. Eu não tinha mais salvação.
Demi  bateu na porta novamente, de leve, e meus pés foram na direção dela. Esfreguei as mãos uma na outra antes de parar em frente à porta e apoiá-las ali.
Imaginei as mãos de Demi tocando as minhas do outro lado da porta, os dedos exatamente na mesma posição que os meus.
— Joseph — disse ela, pronunciando em seguida as nove palavras que provocaram um aperto no meu peito. — A cada segundo. Cada minuto. Cada dia. Cada hora.
Prendi a respiração. As palavras soaram mais sinceras do que nunca.
— Por favor, abre a porta, Joseph — continuou ela. — Por favor, me deixa entrar. Volta pra mim.
Afastei as mãos da porta e esfreguei os dedos várias vezes.
— Eu poderia ter matado o cara.
— Você jamais teria feito isso.
— Vai embora, Demi — pedi. — Por favor, me deixe sozinho.
Por favor — suplicou ela. — Não vou embora sem ver você. Não vou sair daqui enquanto você não me deixar te dar um abraço.
— Deus do céu, vai embora — berrei, escancarando a porta. Minha alma parecia ter sido torturada. Uma melancolia furiosa se abateu sobre mim ao fitar Demi. Baixei os olhos, sem conseguir encarar a única coisa que quase fez o paraíso se tornar realidade. — E fique longe de mim. 
Vou acabar te machucando. Você merece alguém melhor do que eu.
— Você... você não quer isso de verdade — disse ela, com a voz trêmula. Eu não conseguia mais encará-la.
— Quero. Você não pode me salvar — fechei a porta e tranquei-a novamente. Demi bateu com força, gritando meu nome, implorando por uma explicação, suplicando por respostas, mas eu não escutava nada.
Olhei para minhas mãos e vi sangue nos meus dedos, debaixo das minhas unhas, em todo lugar. Não sabia se era meu ou do Stephen. Era como se as paredes estivessem sangrando e eu não conseguisse encontrar uma saída.
Queria pedir desculpas a ele. Queria explicar que eu não devia ter me descontrolado. Queria que tudo tivesse sido apenas um sonho. Queria acordar de manhã e ter minha família de volta. Queria acordar sem nunca saber como um coração pode realmente ficar despedaçado.
Mas, acima de tudo, eu queria dizer a Demi o quanto eu a amava. A cada segundo. Cada minuto. Cada hora. Cada dia.
Me perdoa. Me perdoa. Me perdoa.


***

Depois de muitas horas, quando encontrei forças para sair do galpão, abri a porta e vi Demi sentada no chão agarrada ao casaco, tremendo de frio.
— Você deveria ter ido pra casa — falei, minha voz baixa.
Ela deu de ombros.
Abaixei e peguei-a no colo. Ela passou os braços em volta do meu pescoço e apoiou o rosto no meu ombro.
— O que foi que ele disse? — sussurrou.
— Não importa.
Ela me abraçou com mais força ainda enquanto eu a levava para sua casa.
— Importa sim. Importa muito.
Coloquei-a na cama e virei para sair do quarto. Ela pediu que eu ficasse, mas eu sabia que não podia. Não estava com a cabeça no lugar. Antes de sair da casa, parei no banheiro e lavei as mãos cheias de sangue. A água quente caía, e esfreguei-as com violência, tentando tirar todo o sangue. Eu não conseguia parar. Continuei esfregando-as e passando mais sabonete, mesmo depois de estarem limpas.
— Joseph — falou Demi, tirando-me do meu transe. Ela fechou a torneira, pegou a toalha e envolveu minhas mãos. — O que foi que ele disse?
Encostei minha testa na dela. Inspirei seu perfume, tentando ao máximo não desabar. Ela era a única coisa que mantinha minha sanidade.
— Ele disse que eu matei os dois. Que eu era culpado por Ashley e Charlie estarem mortos e que eu iria fazer o mesmo com você — minha voz embargou. — Ele está certo. Eu matei minha família. Eu devia ter estado lá... devia ter conseguido salvá-los.
— Não, Joseph — interveio ela com firmeza. — Não foi você. O que aconteceu com Ashley e Charlie foi um acidente. A culpa não foi sua.
Balancei a cabeça.
— Foi sim. Foi minha culpa. Culpei minha mãe, mas ela... ela os amava. Não foi culpa dela. Foi minha. A culpa sempre foi minha... — era difícil dizer cada palavra. Respirar estava se tornando uma tarefa difícil. — Tenho que ir — eu me afastei, mas ela bloqueou a porta. — Demi, sai da frente.
— Não.
— Demi...
— Quando eu desabei, quando cheguei no fundo do poço, você me abraçou. Quando perdi a cabeça, você ficou comigo. Então, segure a minha mão e vamos pra cama.
Ela me levou até o quarto e, pela primeira vez, desarrumou o lado direito da cama para que eu me esgueirasse para baixo dos lençóis. Eu a abracei, e ela encostou a cabeça em meu peito.
— Arruinei seu aniversário — falei quando já sentia o sono pesar em minhas pálpebras.
— Não foi sua culpa — insistiu Demi. — Não foi sua culpa. Não foi sua culpa. Não foi sua culpa.
Enquanto ela repetia a frase sem parar, meu coração voltou a se acalmar, meus dedos acariciaram sua pele e, aos poucos, caí no sono. Uma parte de mim começou a acreditar nela.
Por algumas poucas horas naquela noite, lembrei como era não estar sozinho.
Por algumas poucas horas, parei de me culpar.


Gente nem sei o que falar desse capítulo :( Tadinho do Joseph
Esse Stephen é um fdp
Gostaram? me contem aqui nos comentários
bjs amores e até o próximo <3
respostas aqui

2 comentários:

  1. Graças a Deus ela não desistiu dele... amei o capítulo... tadinha da mãe do Joe, tomara que a Demi o convença a pedir perdão pra ela... continuaaa...

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    1. Eles vão se entender no final, no próximo capítulo será revelado um segredo sobre o acidente.
      Vou postar hoje, bjs amor <3

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