31/08/2016

breathe: capítulo 8


No sábado de manhã, pensei que fosse acordar toda a vizinhança com minhas tentativas de ligar o cortador de grama, que falhava o tempo todo. Zachary sempre fazia isso parecer fácil quando aparava a grama do jardim, mas eu não tinha a mesma sorte. 
— Vamos lá — puxei a corda novamente e, depois de titubear, o aparelho morreu. — Jesus Cristo! 
Fiz várias tentativas e fiquei vermelha de vergonha quando alguns vizinhos olharam pela janela para ver o que estava acontecendo. 
Eu estava prestes a puxar a cordinha do cortador de grama mais uma vez quando senti uma mão em cima da minha. Tive um sobressalto. 
— Pare — advertiu Joseph, irritado. — Que diabos você está fazendo? 
Franzi o cenho, olhando para os lábios dele. 
— Cortando a grama. 
— Você não está cortando a grama. 
— Sim, estou. 
— Não, não está. 
— Então o que eu estou fazendo? 
— Acordando o mundo todo, porra
— Tenho certeza de que as pessoas na Inglaterra já estão acordadas. 
— Cala a boca. 
Hummm. Acho que alguém não gosta muito de papo de manhã. Ou de tarde. Ou de noite. Ou de papo. Ele pegou o cortador e o levou para longe de mim. 
— O que você está fazendo? — perguntei. 
— Vou cortar sua grama. Assim você não acorda o mundo todo. Menos a Inglaterra, é claro. Não sabia se ria ou se chorava. 
— Você não vai conseguir cortar a grama. Acho que o cortador está quebrado  — em questão de segundos, ele puxou a corda com força, e o motor começou a funcionar. Ai, que vergonha. — É sério. Você não pode fazer isso. 
Ele nem se virou para me olhar. Simplesmente começou seu trabalho, fazendo algo que jamais pedi que ele fizesse. Quase iniciei uma discussão, mas me lembrei da história de que ele tinha matado um gato só porque estava miando muito e, bem, achei melhor preservar minha existência patética. Preferi não correr o risco. 
— Ficou ótimo — elogiei quando Joseph desligou o cortador. — Meu marido... — fiz uma pausa e respirei fundo. — Meu falecido marido sempre cortava a grama em linhas diagonais. E sempre dizia: “Amor, vou recolher os tufos de grama amanhã. Estou muito cansado agora.” — dei um sorriso triste e olhei para Joseph, sem vê-lo de fato. — Os tufos ficavam por aí pelo menos uma semana. Às vezes, duas. Era estranho, ele sempre cuidava muito melhor do gramado dos outros. Mesmo assim, eu gostava daqueles tufos — falei, meio ofegante, e lágrimas brotaram em meus olhos. Virei-me para Joseph, secando-as. — Enfim, achei legal você também ter cortado em diagonal — lembranças idiotas. Coloquei a mão na maçaneta da porta, mas meus pés se detiveram quando o ouvi. 
— Elas aparecem sem você perceber e acabam te derrubando — comentou ele baixinho, como uma alma abandonada que se despede de sua família. Sua voz estava muito mais suave. Ainda soava meio ríspida, mas dessa vez havia um pouco de inocência nela. — As pequenas lembranças. 
Voltei-me e vi que ele estava encostado no cortador de grama. Seu olhar tinha mais vida do que das outras vezes, mas era uma vida triste. Um olhar sombrio e devastado. Apoiei-me para não perder o equilíbrio. 
— Às vezes, acho que as pequenas recordações são as piores. Consigo lidar com as lembranças do aniversário dele e até do dia em que ele morreu, mas quando as pequenas coisas vêm à tona, como o modo como ele cortava a grama, ou ele pegando o jornal só pra ler as tirinhas, ou fumando charuto na véspera do ano-novo... 
— Ou a forma como ela amarrava os sapatos, pulava as poças de água da chuva, tocava a palma da minha mão com o indicador e fazia o desenho de um coração nela... 
— Você também perdeu alguém? 
— Minha esposa. 
Ah
— E meu filho — sussurrou ele, ainda mais baixo. 
Fiquei de coração partido. 
— Sinto muito. Não imaginei... — não achei as palavras enquanto ele olhava para minha grama recém-cortada. A ideia de perder tanto o amor da minha vida quanto minha filha era demais para mim, não consegui nem imaginar essa possibilidade. 
— O jeito como ele rezava, a forma como escrevia o R ao contrário, os carrinhos de brinquedo que ele desmontava para depois consertar... 
A voz de Joseph estava trêmula, assim como seu corpo. Ele não se dirigia mais a mim. Nós dois estávamos em mundos separados, feitos de nossas pequenas recordações, e, ainda assim, conseguíamos sentir a dor um do outro. A solidão reconhecia a solidão. E hoje, pela primeira vez, consegui enxergar o homem que ele era. 
Vi a comoção em seus olhos quando ele colocou os fones de ouvido. Começou a varrer os tufos de grama e não falou mais nada. 
As pessoas da cidade achavam que ele era um idiota, e eu até entendia o porquê. Ele não estava bem, sentia-se completamente destruído, mas eu não o culpava pela frieza. Na verdade, eu meio que invejava a maneira como Joseph escapava da realidade, se desligava do mundo e se fechava para tudo ao seu redor. Devia ser bom se sentir vazio de vez em quando. Só Deus sabe que eu pensava em me desligar do mundo todos os dias, mas eu tinha Elizabeth para manter minha sanidade. 
Se eu a tivesse perdido, também abriria mão de todo o sentimento, de toda a dor. 
Quando terminou tudo no jardim, Joseph permaneceu imóvel, mas sua respiração ainda estava pesada. Ele me encarou com os olhos vermelhos e os pensamentos provavelmente confusos. Enxugou a testa com a mão e pigarreou. 
— Pronto. 
— Quer tomar café? — perguntei. — Tem o suficiente pra nós dois.
 Ele colocou o cortador de grama de volta na minha varanda. 
— Não — e saiu, desaparecendo de vista. Fiquei lá, de pé, com os olhos fechados. Levei as mãos ao coração e, por um breve momento, também me desliguei do mundo.

Gente estou vendo que os capítulo não estão tendo muitos comentários, porém as visualizações são muitas só peço que você comentem para eu saber se vocês estão gostando da história e as opiniões de vocês.
Me contem aqui nos comentários o que acharam
bjs lindonas <3
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29/08/2016

breathe: capítulo 7


2 de abril de 2014 
Cinco dias antes do adeus 

Quando o táxi deixou meu pai e eu no hospital, corri para a emergência. Passei os olhos pela recepção à procura de algo, de alguém conhecido. 
— Mãe — chamei, e então ela me viu da sala de espera. Tirei o boné e corri em sua direção. — Ah, filho. 
Ela me abraçou, chorando. 
— Como eles estão? Como... 
Mamãe começou a soluçar, seu corpo estremecendo. 
— Ashley... Ashley se foi, Joseph. Ela lutou muito, mas não conseguiu. 
Eu a soltei. 
— Como assim, ela se foi? Ela não foi a lugar algum. Ela está bem — olhei para meu pai, que me encarava, chocado. — Pai, fala pra ela. Fala que Ashley está bem. 
Ele abaixou a cabeça. 
Tudo dentro de mim se inflamou. 
— Charlie? — perguntei, sem saber se queria mesmo saber a resposta. 
— Está no CTI. Ele não está reagindo muito bem, mas... 
— Aqui. Ele está aqui — passei a mão pelo cabelo. Ele estava bem. — Posso vê-lo? — perguntei. 
Minha mãe assentiu. Corri para a recepção e falei com as enfermeiras, que me levaram até o quarto de Charlie. Levei as mãos à boca quando olhei para o meu filho e todas as máquinas ligadas a ele. Estava entubado, vários medicamentos sendo injetados em suas veias, e seu rosto estava machucado, roxo. 
— Meu Deus... — murmurei.
 A enfermeira me deu um sorriso cauteloso. 
— Você pode segurar a mão dele. 
— Por que o tubo? P-p-por que ele está entubado? — gaguejei. Minha cabeça tentava se concentrar em Charlie, mas a ficha começou a cair. Ashley se foi, minha mãe disse. Ela se foi. Mas como? O que aconteceu? 
— O acidente provocou um pneumotórax no pulmão esquerdo, e ele está com muita dificuldade pra respirar. O tubo é para ajudá-lo. 
— Ele não consegue respirar sozinho? 
Ela balançou a cabeça. 
— Ele vai ficar bem? — perguntei para a enfermeira e vi o remorso em seu olhar. 
— Não sou médica. Só eles podem... 
— Mas você pode me dizer, não pode? Coloque-se no meu lugar. Acabei de perder minha esposa — falar isso em voz alta mexeu com minhas emoções e respirei fundo, em choque. — Se esse garotinho fosse tudo que te restasse no mundo, você iria querer saber se ainda resta uma esperança, certo? Você imploraria a alguém que te dissesse o que fazer. Como fazer. O que você faria? 
— Senhor... 
— Por favor — supliquei. — Por favor. 
Ela olhou para o chão e depois para mim. 
— Eu seguraria a mão dele. 
Assenti. Soube naquele momento que ela havia acabado de me dizer a verdade que eu não queria ouvir. Sentei na cadeira do lado da cama de Charlie e peguei sua mão. 
— Oi, filho, sou eu. O papai está aqui. Sei que eu estava longe, mas agora estou aqui, tá? Estou aqui e preciso que você lute. Você consegue fazer isso, cara? — lágrimas escorriam pelo meu rosto, e beijei sua testa. — Papai precisa que você volte a respirar sozinho. Você tem que melhorar, porque preciso de você. Sei que as pessoas dizem que os filhos precisam dos pais, mas é mentira. Preciso de você pra seguir em frente. Pra continuar acreditando no mundo. Cara, preciso que você acorde. Não posso perder você também, tá? Preciso que você volte pra mim... Por favor, Charlie... Volte para o papai. 
O peito dele começou a inflar, mas, quando ele tentou expirar, as máquinas começaram a apitar. Os médicos correram até o leito e tiraram minha mão da dele. Charlie tremia incontrolavelmente. Eles gritavam um com o outro, dizendo coisas que eu não entendia, fazendo coisas que eu não compreendia. 
— O que está acontecendo? — berrei, mas ninguém me ouviu. — O que houve? Charlie — gritei, e duas enfermeiras tentaram me tirar do quarto. — O que eles estão fazendo? O que... Charlie! — gritei cada vez mais alto enquanto elas finalmente me arrancavam do quarto. — Charlie!
Na sexta-feira à noite, sentei-me à mesa de jantar e disquei um número que um dia foi muito familiar para mim, mas que eu não usava há algum tempo. Segurei o telefone junto ao ouvido. 
— Alô? — respondeu uma voz suave. — Joseph, é você? — O tom cauteloso em sua voz provocava um aperto no meu estômago. — Filho, por favor, fale alguma coisa... — murmurou ela. 
Levei a mão fechada à boca e a mordi, sem responder. 
Desliguei o telefone. Sempre desligava. Continuei ali sozinho pelo resto da noite, deixando a escuridão me engolir.
Gente esses flashbacks me matam :( Vai ter alguns na história contando um pouco mais sobre o acidente de Ashley e Charlie!
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bjs lindonas <3
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27/08/2016

breathe: capítulo 6


Sam apareceu durante a semana para trocar as fechaduras. Eu sabia que Selena o chamava de esquisito, mas ele era tão simpático que achei fácil gostar dele. Seu cabelo loiro, e os óculos retangulares escondiam seus olhos castanhos e suaves. Ele falava comigo bem baixinho, desculpando-se o tempo todo, gaguejando um pouco e achando que havia me ofendido quando não tinha feito nada de mais. 
— Algumas estão bem ruins, mas a maioria das fechaduras, na verdade, está em bom estado. Quer que eu troque todas? Tem certeza? Desculpe, foi uma pergunta idiota. Eu não estaria aqui se você não quisesse trocar todas elas. Me perdoe — desculpou-se. 
— Imagina, está tudo bem — sorri. — Só quero recomeçar minha vida com tudo novo. 
Ele ajeitou os óculos no nariz. 
— É claro. Acho que consigo terminar tudo em algumas horas.
— Perfeito. 
— Olha, deixa eu te mostrar uma coisa — ele correu até o carro e voltou com um objeto pequeno na mão. — Acabou de chegar uma câmera de segurança na loja do meu pai, caso você tenha interesse. Elas são pequenas e bem fáceis de esconder. Poderíamos colocar algumas para você se sentir mais segura. Se eu fosse uma mulher bonita como você, e morasse sozinha com uma filha pequena, iria querer me sentir mais segura. 
Sorri, mas dessa vez com cautela. 
— Vou pensar no assunto. Muito obrigada, Sam. 
— Sem problemas — ele riu. — A única pessoa que comprou até agora foi o Stephen. Acho que as câmeras não vão vender tanto quanto meu pai esperava. 
Sam era ágil e muito bom. Antes que eu me desse conta, todas as fechaduras da casa estavam trocadas, novinhas em folha. 
— Posso ajudar em algo mais? — perguntou. 
— Não, só isso mesmo. Preciso ir, tenho que estar no café em dez minutos. Meu carro simplesmente morreu, e vou andando até lá. 
— De forma alguma. Eu te dou uma carona — ofereceu ele. 
— Não precisa. Posso ir andando. 
— Já está garoando, e a chuva pode ficar mais forte. Não tem problema, eu te levo. 
— Tem certeza? 
— Claro que sim — ele abriu a porta do passageiro de sua caminhonete. — Sem problemas. Durante o caminho, Sam me perguntou por que Selena não gostava dele, e tentei explicar, da melhor maneira possível, que Selena não gostava de ninguém à primeira vista. 
— Dê um tempo a ela, vocês vão acabar se entendendo. 
— Ela disse que eu tinha todas as características de um psicopata. 
— Eu sei. Ela é um pé no saco. 
— E é sua melhor amiga. 
— A melhor que alguém poderia ter — respondi, orgulhosa. 
O restante do caminho foi tranquilo. Sam apontava para todas as pessoas pelas quais passávamos e relatava tudo que sabia sobre elas. Ele me contou que, como todos o achavam esquisito, normalmente o ignoravam, e ele acabava ouvindo todas as fofocas da cidade. 
— Aquela ali é a Lucy — indicou Sam, apontando para uma garota que estava ao celular. — Ela é a melhor soletradora da cidade. Ganhou o concurso anual de soletração nos últimos cinco anos. E aquela ali é a Monica. O pai dela é um alcoólatra que finge estar sóbrio, mas, cá entre nós, sei que ele bebe no bar da Bonnie Deen todas as sextas-feiras. E aquele lá é o Jason. Ele me deu uma surra alguns meses atrás porque achou que eu o xinguei. Depois se desculpou e disse que estava chapado. 
— Uau! Você realmente sabe tudo sobre todo mundo. 
Ele concordou: 
— Você tem que ir comigo a um desses conselhos de moradores da cidade. Vou te mostrar a loucura que é esse lugar. 
— Ótima ideia — sorri. 
Quando estacionamos o carro, senti um frio na barriga ao olhar para o outro lado da rua. 
— E aquele ali? — perguntei ao ver Joseph passar correndo, com fones no ouvido. Quando chegou à loja do Sr. Henson, ele tirou os fones e entrou. — Qual é a história dele? 
— Joseph? Ele é grosseiro e meio desequilibrado. 
— Desequilibrado? 
— Bom, ele trabalha para o Sr. Henson. A pessoa tem que ter um parafuso a menos pra lidar com ele. O Sr. Henson pratica vodu e essas esquisitices no quartinho dos fundos. É muito bizarro. Ainda bem que Stephen está tentando fechar a loja. 
— Por quê? 
— Você não soube? Stephen quer aumentar a oficina, e a loja do Sr. Henson está impedindo a expansão. Parece que ele está tentando iniciar uma campanha para forçar o Sr. Henson a desistir da loja, com o argumento de que o local é um desperdício de espaço para a cidade, já que ninguém entra lá. 
Fiquei imaginando qual era a verdadeira história por trás da loja do Sr. Henson e o motivo de Joseph estar trabalhando lá. 
Durante meu turno, eu olhava de vez em quando para a loja do outro lado da rua, onde Joseph estava arrumando alguns objetos. O local era cheio de coisas esotéricas, cristais, cartas de tarô, varinhas mágicas... 
— Você tem um vibrador? 
Quando a pergunta saiu da boca da minha melhor amiga, quase derrubei os três pratos de hambúrguer com fritas que estava carregando. 
— Selena — protestei baixinho, nervosa e ruborizada. 
Seu olhar percorreu o café, ela estava chocada com minha reação diante da pergunta, digamos, inapropriada. 
— O que foi? Parece até que estou perguntado se você tem herpes. Vibradores são objetos normais nos dias de hoje, Demi. Outro dia mesmo eu estava pensando em sua pobre vagina, velha e seca. 
Meu rosto pegou fogo. 
— Quanta consideração — ri, colocando os pratos diante de três senhoras que olhavam para nós com desprezo. — Mais alguma coisa? — perguntei a elas. 
Elas negaram.
— Demi, só estou dizendo que já faz tempo, né? Como está a situação aí embaixo? Está tipo George, o rei da floresta encontra As supergatas?  — ela deu um leve tapinha na minha cabeça.
 — Eu me nego a responder isso. 
Ela colocou a mão no bolso do avental e tirou um caderninho preto que antigamente sempre nos metia em encrenca. 
— O que você está fazendo? — perguntei, preocupada. 
— Vou procurar um pau pra te ajudar hoje à noite. 
— Selena, não estou pronta para sentir qualquer coisa por alguém. 
— E o que sexo tem a ver com sentimentos? — argumentou ela, séria. Eu não sabia nem como abordar o assunto. — Enfim, conheço um cara que pode tirar as ervas daninhas do seu jardim. O nome dele é Edward. Ele é um gênio criativo pra essas coisas. Uma vez, ele até fez um coraçãozinho lá embaixo pra mim no dia dos namorados. 
— Você é muito perturbada. 
Selena sorriu. 
— Eu sei, mas posso marcar um horário pra você com o Edward mãos de tesoura, e depois você vai escolher um cara bem legal no meu caderninho e vai passar uma noite com ele — sugeriu ela. 
— Uma noite de sexo casual... isso não é para mim. 
— Tudo bem. Pode ser de manhã, se você preferir — ela deu um risinho. — É sério, Demi. Você já pensou em voltar a namorar? Pelo menos sair com alguns caras? Não precisa ser nada sério, mas poderia fazer bem a você. Não quero que fique presa nesse limbo! 
— Não estou presa num limbo — retruquei, um pouco ofendida. — É só que... eu tenho uma filha e faz apenas um ano que Zachary morreu. 
Uau. 
O modo como aquela frase saiu da minha boca, quase sem emoção, me deixou impressionada. 
— Não falei por mal. Você sabe que eu te amo e o quanto Zachary era importante pra mim. 
— Eu sei... 
— Olha, sei que sou meio promíscua, mas mesmo pessoas como eu já tiveram decepções amorosas, e, pra mim, quando as coisas estão complicadas, sexo sempre ajuda. 
— Acho que não estou pronta pra isso, mas prometo que vou pensar no assunto.
—Eu entendo, amiga. Quando você achar que chegou a hora e que precisa do meu caderninho, é só avisar. 
— Seu caderninho está meio pequeno. Jurava que ele era maior — dei uma risada. 
Ela colocou a mão no bolso do avental de novo e pegou mais dois cadernos iguais ao primeiro. 
— Imagina. Eu só estava fingindo humildade mostrando um de cada vez. 

***

Na hora do intervalo, fui vencida pela minha curiosidade e acabei entrando na loja do Sr. Henson. Em poucos segundos, pude perceber que ele vendia todo tipo de artigo esotérico. Metade do espaço da loja era ocupado por um café, e a outra metade mais parecia um closet repleto de objetos que eu conhecia apenas de histórias sobrenaturais. 
A sineta da porta tocou quando eu entrei, e o Sr. Henson e Joseph se entreolharam, confusos. Tentei agir da forma mais natural possível. Explorei a loja, mesmo sabendo que eles ainda me observavam. 
Parei por um momento e peguei um livro de uma prateleira. Um livro de feitiços? Ok, tudo bem. As páginas estavam unidas por um barbante e cobertas de poeira. Peguei outro. Os dois pareciam mais velhos do que empoeirados, mas mesmo assim eram bonitos. Meu pai adorava descobrir grandes pérolas da literatura em sebos. Ele tinha uma coleção enorme de livros de diferentes gêneros e idiomas em seu escritório. Muitos não tinham qualquer utilidade para ele, mas ele adorava sentir a textura das capas e admirá-las. 
— Quanto por esses dois? — perguntei ao Sr. Henson. Ele continuou em silêncio e ergueu a sobrancelha. — Desculpe, a loja está fechada? — quando vi o olhar de Joseph, segurei os livros junto ao peito e fiquei vermelha na hora. — Oi. 
Para meu alívio, o Sr. Henson interveio. 
— Ah! Não, não. Está aberta. É que não recebemos muitas clientes. Especialmente, tão bonitas como você — respondeu o dono da loja, sentando-se no balcão. — Qual é o seu nome, minha querida? — A pergunta dele fez com que eu parasse de olhar para Joseph, e então pigarreei, aliviada pela distração. 
— Demi. E o do senhor? 
— Sou o Sr. Henson. Se eu não fosse quatrocentos anos mais velho que você e não me sentisse tão atraído pela anatomia masculina, provavelmente iria convidá-la para dançar. 
— Dançar? Por que o senhor acha que uma garota como eu gostaria de dançar? 
O Sr. Henson não respondeu, mas ficou com aquela expressão de deleite no rosto. 
Sentei-me ao lado dele e perguntei: 
— Essa loja é sua? 
— É, sim. Cada pedacinho e metro quadrado. A não ser que você a queira — ele riu. — Porque, se você quiser, ela é sua. Cada pedacinho e metro quadrado. 
— É uma oferta tentadora. Mas tenho que confessar que já li todos os livros de Stephen King pelo menos umas cinco vezes, e a ideia de ter uma loja como esta chamada Artigos de Utilidade me assusta. 
— Cá entre nós, pensei no nome Artigos Para Sua Prece Ser Atendida, mas não sou muito religioso. 
Joseph e eu rimos. 
Olhei para ele, feliz por estarmos achando graça da mesma coisa, mas, na mesma hora, ele fechou a cara. 
Voltei a olhar para os livros. 
— Tudo bem se eu levar estes? 
— São seus, pode levar. De graça. 
— Ah, não... quero pagar. 
Acabamos entrando numa discussão sobre eu pagar pelos livros ou não, mas eu não cederia. O Sr. Henson entregou os pontos. 
— É por isso que prefiro homens. As mulheres são muito parecidas comigo. Volte outro dia e vou fazer uma leitura de tarô de graça pra você. 
— Parece uma ótima ideia. 
Ele se levantou e começou a andar. 
— Joseph, cuide dela — O Sr. Henson virou-se na minha direção e assentiu levemente com a cabeça antes de desaparecer no estoque. 
Joseph foi até o caixa, e eu o segui. 
Coloquei os livros lentamente sobre o balcão. Vi algumas fotos em preto e branco de uma floresta emolduradas em uma parede atrás dele. 
— Que bonito — falei, admirando o trabalho. 
Joseph calculou o valor dos livros. 
— Obrigado. 
— Foi você quem tirou? 
— Não — respondeu ele, olhando para as fotos. — Esculpi e acrescentei a tinta preta. 
Meu queixo caiu quando cheguei mais perto da imagem. Ao observá-la com atenção, vi que as “fotos”, na verdade, eram desenhos entalhados em madeira. 
— Que lindo — murmurei novamente. Quando nossos olhares se cruzaram, senti de novo aquele frio na barriga. — Oi — repeti, suspirando. — Como vai? 
Ele continuou a fazer as contas, ignorando minha pergunta. 
— Vai pagar por essa porra ou não vai? 
Franzi a testa, mas ele nem ligou. 
— Desculpe. Sim. Aqui está — falei, entregando-lhe o dinheiro. Agradeci antes de sair da loja e olhei para ele mais uma vez. — Você age com estupidez o tempo todo, e a cidade acha que você é um grosso, mas eu te vi naquela sala de espera quando soube que Zeus iria ficar bem. Vi você chorar. Você não é um monstro, Joseph. Só não entendo por que finge ser. 
— Esse é o seu maior erro. 
— Qual? — perguntei. 
— Você pensa que sabe alguma coisa sobre mim.

O Sam é um fofo com a Demi e o Joseph estúpido, mas logo ele irá ficar mansinho kkkkkkkkk
A Selena quererndo empurrar homem pra cima da Demi, Selena é comédia demais

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bjs lindonas <3

25/08/2016

breathe: capítulo 5


— Demi, você teve coragem de ir embora com a Elizabeth sem nem me ligar! — reclamou mamãe, muito irritada. Elizabeth e eu já tínhamos voltado há dois dias, e ela só estava ligando agora. Existiam apenas duas explicações para a atitude dela: ou estava muito magoada por termos ido embora e deixado só um bilhete, ou estava passeando pela cidade com algum desconhecido e havia acabado de chegar em casa. 
Achei que a segunda opção fazia mais sentido. 
— Sinto muito, mas você sabia que eu estava pensando em ir embora. Precisamos de um novo começo — tentei explicar. 
— Um novo começo na sua velha casa? Isso não faz sentido. 
Eu sabia que ela não ia entender, então mudei de assunto. 
— Como foi o jantar com Roger? 
— Richard — corrigiu ela. — Não finja que não sabe o nome dele. Foi incrível. Acho que encontrei o cara certo. 
Revirei os olhos. Todos os homens que ela conhecia eram “o cara certo”, até que deixavam de ser. 
— Você está revirando os olhos? — perguntou ela. 
— Não. 
— Está sim, não está? Às vezes você consegue ser tão grosseira... 
— Mamãe, preciso ir para o trabalho — menti. — Posso ligar pra você depois? 
Talvez amanhã. 
Talvez na próxima semana. 
Só preciso de um tempo. 
— Tudo bem. Mas não se esqueça de quem ficou ao seu lado quando você não tinha ninguém, filhinha. É claro que os pais do Zachary devem estar ajudando, mas vai chegar o momento em que você vai perceber quem é sua verdadeira família e quem não é. 
Nunca me senti tão aliviada por desligar o telefone. 
De vez em quando, eu olhava para o jardim coberto de mato, tentando me lembrar de como era antes. Steven havia transformado aquele espaço em um lugar lindo; ele era um ótimo paisagista e cuidava dos mínimos detalhes. Eu quase conseguia sentir o aroma das flores que ele plantou — que, obviamente, estavam mortas agora.
— Feche os olhos — sussurrou Zachary, apoiando a mão nas minhas costas. Fiz o que ele pediu. 
— Qual é o nome dessa flor? — perguntou. 
O aroma chegou ao meu nariz, e eu sorri. 
— Jacinto. 
Abri um sorriso ainda maior quando senti seus lábios nos meus. 
— Jacinto — repetiu ele. Eu abri os olhos, e ele colocou a flor atrás da minha orelha. — Pensei em plantar mais algumas perto do lago. 
— É minha flor favorita. 
— Você é a minha garota favorita. 
Pisquei e, em um instante, estava de volta, sentindo falta do cheiro do passado. 
Olhei para a casa do meu vizinho, seu jardim estava muito pior que o meu. A casa era toda de tijolos marrom-avermelhados, com colunas brancas de marfim dos dois lados. A grama estava dez vezes maior que a minha, e vi pedaços do que um dia foi um anão de jardim na varanda dos fundos da casa. Tinha um taco de beisebol de brinquedo, feito de plástico amarelo, escondido na grama alta junto com um pequeno dinossauro. 
Uma mesa vermelha, toda descascada, estava ao lado de um galpão. Havia também algumas pilhas de madeira apoiadas ali, e me perguntei se alguém, de fato, já havia morado naquele lugar. Parecia mais abandonado do que nunca, e me preocupei com a sanidade do meu vizinho. 
Atrás das casas do meu quarteirão ficava o bosque de Meadows Creek. Eu sabia que, bem mais adiante, quase escondido no meio daquela floresta sombria, havia um riacho que se estendia por vários quilômetros. A maioria das pessoas nem sabia que ele existia. Zachary  e eu o descobrimos ainda nos meus tempos de faculdade. Na margem havia uma pequena pedra e, nela, estavam gravadas as iniciais ZE e DM. Fizemos isso no dia em que ele me pediu em casamento. Sem me dar conta, acabei entrando no bosque e me sentei em meio às árvores, encarando meu reflexo na água. 
Uma respiração de cada vez. 
Pequenos peixes nadavam ali tranquilamente, até que ouvi o som da água se agitando e percebi uma ondulação em sua superfície. Virei a cabeça em busca de alguma explicação e fiquei vermelha ao ver Joseph de pé ao lado do rio, sem camisa e vestindo apenas um short de corrida. Ele se abaixou e começou a lavar o rosto, passando os dedos pelos os cabelos. Olhei para ele de cima a baixo, para seu peitoral definido, e o vi jogar a água no corpo. Fiquei observando os músculos em seu corpo, incapaz de desviar o olhar.
A água escorreu do cabelo até o peitoral. E, de repente, fiquei imóvel. Será que ele sabia o quanto era bonito e, ao mesmo tempo, assustador? 
Meu Deus, por quanto tempo posso continuar olhando esse homem, antes de ser politicamente incorreta? 
Não sei, Demi. Vamos descobrir. Um, dois, três... 
Ele não tinha me visto, e comecei a me afastar do riacho com o coração disparado, na esperança de que ele não percebesse minha presença. 
Mas Zeus estava amarrado a uma árvore e, assim que me viu, começou a latir. 
Droga! 
Joseph olhou na minha direção com a mesma frieza de antes. Ele parou, e a água começou a escorreu do seu tórax até o cós do short. Continuei encarando-o e percebi que minha atenção estava voltada para o volume dentro de sua roupa. Ergui o olhar rapidamente de volta para seu rosto, que continuava sem se mover um centímetro sequer. Zeus continuou latindo e abanando o rabo, tentando se soltar da coleira. 
— Você está me seguindo? — perguntou ele. As palavras foram ríspidas e diretas, sem dar margem à conversa. 
— O quê? Não. 
Ele ergueu a sobrancelha. 
Continuei observando seu corpo. Ele notou meu olhar. 
Que merda, Demi. Pare com isso. 
— Desculpe — murmurei, meu rosto pegando fogo, tamanho constrangimento. O que ele estava fazendo ali? 
Joseph olhou para mim sem sequer piscar. Ele poderia ter falado qualquer coisa, mas tive a impressão de que se divertia muito mais me deixando envergonhada e ansiosa. Era difícil olhar para ele. Parecia um homem devastado, mas cada uma das cicatrizes de sua existência me atraía. 
Continuei observando-o enquanto ele tirava a coleira de Zeus da árvore e voltava pelo mesmo caminho que eu tinha vindo. Eu o segui, rumo à minha casa. 
Ele parou. 
Virou-se devagar. 
— Pare de me seguir — sibilou. 
— Não estou seguindo você. 
— Está sim. 
— Não.
 — Está. 
— Não, não, não! 
Ele ergueu a sobrancelha de novo.
 — Você parece uma criança de 5 anos. 
Ele se virou e continuou andando. Também continuei. De vez em quando, ele olhava para mim e grunhia, mas não falou nada. Chegamos ao final da trilha, e ele e Zeus seguiram para o jardim maltratado ao lado da minha casa. 
— Acho que somos vizinhos — observei, com uma risada sem graça. 
O modo como Joseph olhou para mim me provocou um frio na barriga. Um desconforto persistia em meu peito, mas, por trás daquilo, eu ainda podia perceber aquela pontada familiar que eu sentia todas as vezes em que o encontrava. 
Nós dois seguimos para nossas respectivas casas sem nos despedirmos. 


***

Jantei sozinha à mesa da sala de jantar. Quando olhei pela janela, vi Joseph, também sentado a uma mesa, comendo. A casa dele parecia muito escura e vazia. Solitária. Ele olhou pela janela e me viu. Acenei e sorri para ele. Ele se levantou, foi até a janela e fechou a cortina. 
Não demorei muito para perceber que as janelas dos nossos quartos ficavam uma de frente para a outra, e ele fechou a cortina novamente, bem depressa. 
Liguei para checar se estava tudo bem com Elizabeth e, pelo barulho, deu para perceber que ela estava muito agitada. Provavelmente por ter comido muitos doces e por estar se divertindo muito na casa dos avós. Mais ou menos às oito da noite, sentei-me no sofá da sala, olhando para o nada e tentando não chorar, quando recebi uma mensagem de texto de Selena. 
Selena: Você está bem? 
Eu: Sim, estou. 
Selena: Quer companhia? 
Selena: Hoje, não. Cansada. 
Selena: Tem certeza? 
Eu: Quase dormindo… 
Selena: Absoluta? 
Eu: Amanhã. 
Selena: Amo você. 
Eu: Amo você. 
O barulho de alguém batendo na porta assim que enviei a última mensagem não me surpreendeu. Eu tinha certeza de que Selena viria, porque ela sabia que, quando eu falava que estava bem, na verdade queria dizer o contrário. O que me surpreendeu foi ver outras pessoas além dela na minha porta. Amigos. Selena segurava a maior garrafa de tequila do mundo. 
— Quer companhia? — ela riu. 
Meu olhar foi do meu pijama para a garrafa de tequila. 
— Com certeza 
— Achei que você fosse bater a porta na nossa cara — falou uma voz familiar atrás de mim enquanto eu servia quatro shots na cozinha. Eu me virei e vi me observando, jogando para o alto a moeda que ele sempre trazia consigo. Eu me joguei em seus braços, abraçando-o bem apertado. — Oi, Demi — murmurou ele, retribuindo meu abraço com força. 
Stephen era o melhor amigo de Zachary, e eles eram tão próximos que cheguei a pensar que meu marido iria me trocar por um homem. Ele era forte, tinha olhos azuis e cabelos escuros. Trabalhava na oficina mecânica do pai, que passou a administrar depois que ele ficou doente. Ele e Stephen tornaram-se melhores amigos quando dividiram o quarto no primeiro ano da faculdade. Apesar de Stephen ter desistido da universidade para trabalhar com o pai, ele e meu marido continuaram muito próximos. 
Stephen deu um sorriso amigável e me soltou. Pegou dois shots, me passou um deles e bebemos juntos. Em seguida, ergueu os outros dois e fizemos o mesmo. Sorri. 
— Sabe, essas quatro doses eram para mim. 
— Eu sei. Só estou tentando poupar seu fígado. 
Vi quando ele colocou a mão no bolso e pegou uma moeda. A mesma moeda que ele sempre girava entre os dedos. Era um hábito estranho que ele já tinha antes de nos conhecermos. 
— Você ainda tem sua moeda. 
— Nunca saio de casa sem ela — respondeu, rindo, antes de guardá-la no bolso. 
Estudei seu rosto. Provavelmente ele não sabia disso, mas, de vez em quando, dava para ver a tristeza em seu olhar. 
— Como você está? 
Ele deu de ombros. 
— É muito bom ver você de novo. Cara, faz tanto tempo. E você praticamente sumiu depois... — ele parou de falar. Ninguém sabia o que dizer sobre a morte do Zachary. O que eu achava bom. 
— Agora estou de volta — fiz um gesto enquanto servia mais quatro shots. — Elizabeth e eu voltamos pra ficar. Só precisávamos de um tempo. Só isso. 
— Você ainda dirige aquela lata-velha? — perguntou Stephen
— Sim, com certeza — mordi o lábio. — Outro dia atropelei um cachorro. 
— Não
Ele ficou boquiaberto. 
— Verdade. O cachorro está bem, mas a droga do freio não funcionou direito e quase passei por cima dele. 
— Vou cuidar disso pra você. 
— Tudo bem, eu normalmente vou andando pra todos os lugares da cidade. Sem problemas. 
— Vai ser um problema quando o inverno chegar. 
— Não se preocupe, Stephen Michael Amell, vai dar tudo certo.
 — Odeio quando você me chama pelo nome completo — disse ele, fazendo uma careta. 
— É exatamente por isso que eu te chamo assim. 
— Então vamos fazer um brinde — sugeriu ele. Selena veio correndo e pegou um dos copos. 
— Adoro fazer brindes com tequila — ela soltou uma risada. — Ou vodca, uísque, rum, álcool… 
Sorri, e nós três levantamos os copos. Stephen pigarreou: 
— A velhos amigos e novos começos. Sentimos falta de você e da Elizabeth, Demi. Estamos muito felizes com o retorno de vocês. Que os próximos meses sejam mais fáceis, e que você nunca se esqueça de que não está sozinha. 
Com um único movimento, viramos as doses rapidamente. 
— Aqui vai uma pergunta aleatória. Eu queria mudar todas as fechaduras da porta. Você conhece alguém que possa fazer esse serviço? 
— Sam, com certeza — respondeu Selena. 
— Sam? 
— Sabe aquele cara que eu tentei demitir pra contratar você? Aquele esquisitão do café? O pai dele tem uma loja, e ele trabalha meio período lá fazendo esse tipo de coisa. 
— Sério? Será que ele me ajudaria? 
— Claro que sim. Vou pedir pra ele te ajudar, caso contrário eu o demito novamente — Selena piscou. — Ele é esquisito, mas trabalha bem e é rápido. 
— E desde quando você gosta de caras rápidos? — debochei. 
— Às vezes, tudo que uma garota precisa é de um pau, uma cerveja e um reality show, tudo isso em meia hora. Nunca subestime o poder de uma rapidinha — retrucou Selena enquanto enchia seu copo e saía dançando para beber com meus outros amigos. 
— Sua melhor amiga talvez seja a única mulher que conheço que pensa como um homem — brincou Stephen
— Você sabia que ela e o Matty estão... 
— Transando? Claro que sim! Depois que você foi embora ela precisava de uma amiga para despejar suas reclamações e decidiu que eu tinha uma vagina. Ela ia até a oficina todo dia falar do “Matty Grossinho”, o que aliás me deixava bastante constrangido.
 — Você não se interessa pelos apelidos e sex-cionamentos dela? — soltei uma risadinha. 
— Frankie Descamado? É sério? — perguntou ele. 
— Selena não é de contar mentira. 
— Coitado do Frankie. 
Eu ri. Não sei se por causa do álcool ou porque ver Stephen me lembrava de coisas boas. Ele se sentou no balcão da cozinha e deu um tapinha ao seu lado, me convidando para sentar também. Aceitei na hora. 
— Então, como está a senhorita Elizabeth? 
— Moleca como sempre — respondi, pensando na minha garotinha. 
— Igual à mãe — ele sorriu. 
Bati de leve no ombro dele. 
— Ainda acho que ela herdou isso do pai. 
— Verdade. Ele dava muito trabalho. Lembra aquele Halloween em que ele achou que poderia lutar com todo mundo só porque estava vestido de ninja? Ele ficou dando aqueles gritinhos de ninja para quem se aproximava da gente, mas, em vez de ser um ninja de verdade, acabou com um olho roxo e nós três fomos presos — gargalhamos, lembrando como meu marido era terrível quando bebia. 
— Se bem me recordo, você também nunca foi uma boa influência. Sempre bebia demais e virava um babaca, provocando as pessoas até elas baterem em Zachary. 
— Verdade. Não sou flor que se cheire depois de algumas doses, mas Zachary me entendia. Droga, sinto falta daquele cretino — ele suspirou. Paramos de rir, e meus olhos se encheram de lágrimas, assim como os dele. Ficamos em silêncio, sentindo saudades. — Bom — disse Stephen, mudando de assunto. — O jardim está uma merda. Posso cortar a grama se você quiser. E aumentar um pouco a cerca, também para você ter mais privacidade. 
— Não precisa. Na verdade, eu mesma quero cuidar disso. Estou trabalhando só meio período, e vai ser bom ter o que fazer enquanto não encontro um emprego fixo. 
— Você pensou em voltar a trabalhar com decoração? 
A pergunta da semana. Dei de ombros. 
— Não pensei muito neste último ano. 
— Entendo. Tem certeza de que não quer uma mãozinha aqui? Não seria problema nenhum pra mim. 
— Tenho, sim. Cheguei ao ponto em que preciso começar a fazer as coisas sozinha, sabe?
 — Sei. Mas acho que você deveria dar uma passada na oficina no domingo. Queria te dar uma coisa.
 — Um presente? — sorri. 
— Mais ou menos. 
Cutuquei o ombro dele com o meu e disse que poderíamos nos encontrar qualquer dia desses. Perguntei se Elizabeth poderia ir junto. 
Ele concordou, olhou para mim e perguntou baixinho: 
— Qual é a pior parte? 
Essa era fácil de responder. 
— Tem horas que Elizabeth faz algo muito engraçado, e eu chamo Zachary pra ver. Depois, paro e lembro. — A pior parte de perder uma pessoa amada é que você também se perde. levei o dedo à boca e comecei a roer a unha. — Chega de falar de tristeza. E você? Ainda namorando Patty? 
Ele se encolheu. 
— Nós não nos falamos mais. 
Não fiquei surpresa. Stephen levava os relacionamentos tão a sério quanto Selena. 
— Bem, somos parecidos e tristes. 
Ele riu e ergueu a garrafa de tequila, servindo mais um shot. 
— Um brinde a nós. 
O resto da noite meio que passou batido. Lembro que ri de coisas que não eram engraçadas, chorei por coisas que não eram tristes e foi a melhor noite que tive nos últimos tempos. Quando acordei na manhã seguinte, estava deitada na minha cama sem saber como tinha chegado lá. Eu não dormia ali desde o acidente. Peguei o travesseiro de Zachary e o abracei. Senti o cheiro da fronha de algodão e fechei os olhos. Eu não podia mais negar que aquela era a minha casa, mesmo que não sentisse isso naquele momento. Essa era minha nova normalidade.


E esse encontro dos dois de novo? Agora eles sabem que são vizinhos um do outro e a Demi safadinha olhando para o corpo nu do Joseph kkkkkkkkkkkkk
Stephen parece ser um cara legal, mais com o tempo vocês irão ver quem ele realmente é!!! Sofro com essas lembranças da Demi com o Zachary :(
Então gostaram? Me contem aqui nos comentários e até o próximo!!!
bjs lindonas <3
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23/08/2016

breathe: capítulo 4


Na manhã seguinte, Starla e David chegaram bem cedo, animados para levar Elizabeth para um final de semana repleto de aventuras. Já estava pronta para sair quando ouvi alguém bater na porta. Assim que a abri, tive que forçar um sorriso ao ver minhas três vizinhas, três mulheres que não me fizeram a menor falta.
— Oi, Marybeth, Susan e Erica. 
Eu devia ter imaginado que não demoraria muito para as três maiores fofoqueiras da cidade aparecerem na minha porta. 
— Ah, Demi — falou Marybeth ofegante, me abraçando. — Como você está, querida? Ouvimos alguns rumores de que você tinha voltado, mas você sabe, nós odiamos fofocas, então decidimos vir aqui pessoalmente para confirmar. 
— Fiz rocambole de carne — exclamou Erica. — Você foi embora tão rápido quando Zachary morreu que nem tive tempo de fazer um agrado. Então aqui está, finalmente pude fazer esse prato para ajudá-la nesse momento de luto. 
— Obrigada. Na verdade, eu estava indo para... 
— Como está Elizabeth? — interrompeu Susan. — Ela está superando a perda? Minha Rachel sempre pergunta por ela. Será que elas podem brincar juntas lá em casa? Acho que seria ótimo — ela fez uma pausa e se aproximou de mim. — Mas cá entre nós, Elizabeth não está com depressão, né? Ouvi dizer que pode contagiar outras crianças. 
Que ódio. Que ódio. Que ódio. 
— Ah, não, Elizabeth está bem. Estamos bem. Está tudo ótimo — respondi sorrindo. 
— Então você vai voltar ao nosso clube do livro? Estamos nos reunindo todas as quartas na casa da Marybeth. As crianças ficam brincando no andar de baixo enquanto nós comentamos sobre o romance da vez. Esta semana, estamos lendo Orgulho e preconceito
— Eu... — não quero ir de jeito nenhum. Elas ficaram me observando, e eu sabia que, se dissesse não, causaria mais problemas. Além do mais, seria bom para Elizabeth passar um tempo com meninas da idade dela. — Eu vou, sim. 
— Perfeito — Marybeth olhou ao redor. — Seu jardim tem uma personalidade e tanto — comentou com um sorrisinho nos lábios, mas o que ela queria mesmo dizer era: “Quando você vai cortar essa grama? Isso é uma vergonha para todas nós.” 
— Vou dar um jeito nele — respondi. Peguei o rocambole de Erica, coloquei-o dentro de casa e fechei a porta, esforçando-me para deixar claro que eu estava de saída. — Obrigada pela visita, meninas. Preciso ir à cidade. 
— O que você vai fazer na cidade? — quis saber Marybeth. 
— Vou dar uma passada na Doces & Sabores para ver se o Matty precisa de alguma ajuda. 
— Mas ele acabou de contratar uma pessoa. Duvido que tenha vaga pra você — retrucou Erica. 
— Ah, então é verdade? Você não vai mesmo reabrir a empresa? Faz sentido, agora que você não tem mais Zachary — disse Marybeth. 
— Ele era muito competente — acrescentou Susan, concordando. — E sei que você só tem o diploma de designer de interiores. Deve ser difícil deixar um negócio tão interessante e voltar para um trabalho tão... inferior, como garçonete. Eu não conseguiria. É dar um passo para trás. 
Vão se ferrar, vão se ferrar, vão se ferrar
— Bem, vamos ver. Foi ótimo revê-las. Com certeza nos encontraremos em breve — falei, sorrindo. 
— Quarta, às sete — Susan riu. 
Revirei os olhos ao passar por elas e as ouvi cochichar, dizendo que engordei um pouco e que estava com olheiras profundas. 
Andei na direção da Doces & Sabores e tentei disfarçar meu nervosismo. E se eles não precisassem mesmo de ajuda no café? O que eu iria fazer? Os pais de Zachary disseram que eu não deveria me preocupar com dinheiro, que eles ajudariam por um tempo, mas eu não queria ajuda. Precisava encontrar uma maneira de me sustentar. Assim que abri a porta do café, ri ao ouvir um grito vindo de trás do balcão. 
— Por favor, me diga que não é um sonho e que minha melhor amiga voltou — berrou Selena, pulando e me agarrando. Assim sem me soltar, ela olhou para o dono do café. — Matty, me diga que você está vendo o mesmo que eu e que não estou tendo alucinações por causa das drogas que usei antes de vir trabalhar. 
— Ela está aqui mesmo, sua maluca. 
Ele riu. Matty era bem mais velho e sempre revirava os olhos e dava risinhos afetados diante da personalidade vibrante de Selena. Seus olhos castanhos encontraram os meus, e ele acenou para mim. 
— Bom te ver, Demi. 
Selena se aconchegou no meu peito como se fosse o travesseiro dela. 
— Agora que voltou, você nunca, nunca mais vai embora. 
Selena era bonita de uma maneira singular. Seus cabelos eram castanho com mechas loiras. As unhas estavam sempre pintadas com cor neutras, e seus vestidos sempre ressaltavam suas curvas perfeitas. 
O que a fazia ser tão bonita, no entanto, era sua autoconfiança. Selena sabia que era deslumbrante, mas não pela aparência. Ela tinha orgulho de si mesma, não precisava da aprovação de ninguém. 
Eu a invejava por isso. 
— Bom, vim até aqui pra saber se vocês estão contratando. Sei que não trabalho aqui desde a época da faculdade, mas estou precisando de um emprego. 
— É claro que estamos! Ei, Sam — chamou Selena, apontando para um rapaz que eu não conhecia. — Você está despedido. 
— Selena — protestei. 
— O quê? 
— Você não pode simplesmente demitir as pessoas — eu a repreendi ao ver o medo nos olhos de Sam, coitado. — Você não está demitido. 
— Ah, está, sim. 
— Cala a boca, Selena. Não, não está. Como você pode demitir alguém? 
Ela levantou a cabeça e bateu no crachá com seu nome, apontando para o seu cargo. 
— Alguém tinha que ser gerente, mulher. 
Virei para Matty , em choque. 
— Você promoveu Selena à gerência? 
— Acho que ela me drogou — disse ele, rindo. — Mas se precisa mesmo de emprego, sempre vamos ter um lugar pra você aqui, mesmo que por meio período. 
— Meio período seria ótimo. Qualquer coisa está bom — respondi sorrindo, agradecida. 
— Ou eu posso demitir Sam — insistiu Selena. — Ele já tem outro emprego de meio período e é meio esquisitão. 
— Eu estou ouvindo — interveio Sam, envergonhado. 
— Não interessa. Está demitido. 
— Não vamos demitir Sam — interveio Matty. 
— Você é sem graça. Mas quer saber de uma coisa? — ela tirou o avental e soltou um grito: — Hora do almoço 
— São nove e meia da manhã — retrucou Matty . 
— Hora do café, então!— corrigiu Selena, me pegando pelo braço. — Voltamos em uma hora. — Os intervalos são de apenas trinta minutos. 
— Tenho certeza de que Sam vai me dar cobertura. Sam, você não está mais demitido. 
— Você nunca foi demitido, Sam. — Matty riu. — Uma hora, Selena. Traga-a de volta, Demi, ou ela é que vai ser demitida. 
— Ah, é? — Selena colocou as mãos na cintura, quase... sedutora? Matty deu um sorrisinho e passou os olhos pelo corpo dela, de um modo quase...sexual? 
Mas o que foi isso
Saímos do café, o braço de Selena agarrado ao meu, enquanto eu tentava entender o que havia acabado de acontecer entre ela e Matty. 
— O que foi aquilo? — ergui a sobrancelha. 
— Aquilo o quê? 
Aquilo — falei, apontando na direção de Matty. — Aquela cena sensual entre vocês dois? — ela não respondeu e mordeu o lábio. — Meu Deus! Você dormiu com Matty? 
— Cala a boca! Quer que a cidade inteira escute? — ela olhou para os lados, envergonhada. — Foi sem querer. 
— Ah, sério? Sem querer? Você estava distraída, andando pela rua principal, quando Matty veio em sua direção, e o pau dele saiu da calça por acidente? E aí bateu um vento forte e o pau dele foi parar dentro da sua vagina? Foi esse tipo de acidente? — perguntei, tirando sarro. 
— Não foi bem assim. — ela passou a língua pelos cantos da boca. — O vento meio que levou o pau dele até a minha boca primeiro. 
— Pelo amor de Deus, Selena! 
— Eu sei, eu sei! É por isso que as pessoas não deveriam sair de casa quando venta. As pirocas ficam agitadas nos dias de ventania. 
— Não estou acreditando nisso. Ele tem o dobro da sua idade. 
— O que eu posso fazer? Acho que estou curtindo homens mais experientes... uma figura paterna. 
— Bom, seu pai é incrível. 
— Exatamente. Nenhum cara da nossa idade se compara a ele! E Matty... — ela suspirou. — Acho que estou gostando dele. 
Aquilo foi um choque. Selena nunca usou a palavra “gostar” para se referir a um cara. Ela era a maior pegadora que eu conhecia. 
— O que significa “gostar dele”? — perguntei, com a voz cheia de esperança de que minha amiga, finalmente, fosse sossegar. 
— Calma aí, Nicholas Sparks. O que eu quis dizer é que gosto do pau dele. Até dei a ele um apelido. Quer saber qual é? 
— Pelo amor de tudo que é mais sagrado nesse mundo, não. 
— Ah, mas agora vou dizer. 
— Selena — murmurei. 
— Matty Grossinho — contou ela, com um sorriso safado. 
— Você sabe que não precisa me contar essas coisas. Tipo nunca, nunca, nunca mesmo 
— Estou falando: pensa em duas salsichas alemãs. Esse é Matty Grossinho. É como se o deus da salsicha finalmente tivesse ouvido minhas preces. Você se lembra do Peter dedinho e do Nick Cabeludo? Então, é muito melhor! Matty Grossinho é o paraíso das salsichas. 
— Estou quase vomitando. Literalmente. Dá pra mudar de assunto? 
Ela riu e me puxou para perto. 
— Como senti sua falta! Vamos para o nosso lugar de sempre? O que acha? 
— Claro. 
Andamos por alguns quarteirões, e Selena me fez rir muito. Perguntei-me por que fiquei tanto tempo longe. Talvez uma parte de mim se sentisse culpada por saber que, se eu ficasse aqui, me recuperaria aos poucos. Essa ideia me apavorava. Mas, naquele momento, rir era exatamente o que eu precisava. Quando eu ria, não tinha muito tempo para chorar, e eu já estava cansada das lágrimas. 
— É estranho estar aqui sem Elizabeth — comentou Selena, sentando na gangorra do parquinho. Começamos a subir e descer no brinquedo, rodeadas de crianças correndo e brincando com seus pais e suas babás. Uma delas olhou para nós como se fôssemos loucas, mas Selena foi bem rápida e gritou: — Nunca cresçam, crianças! É uma armadilha. 
Ela era ridícula o tempo todo. 
— Então, há quanto tempo está rolando esse lance com Matty? — perguntei. 
— Sei lá... tipo, um mês ou dois — respondeu ela, corando. 
— Dois meses? 
— Talvez sete. Ou oito.
 — O quê? Oito? Nós nos falamos pelo telefone quase todos os dias. Como você nunca comentou nada? 
— Não sei — Selena deu de ombros. — Você estava passando por tantas coisas... E parecia um pouco insensível falar do meu sex-cionamento — Selena nunca teve relacionamentos, mas era profissional nos sex-cionamentos. — Meus problemas eram pequenos, mas os seus... — ela franziu a testa, deixando-me no alto da gangorra. Selena quase nunca assumia uma expressão séria, mas Zachary era como um irmão para ela. Eles brigavam o tempo todo, muito mais do que quaisquer irmãos de verdade que conheci, mas também se importavam muito um com o outro. Foi ela quem nos apresentou, na faculdade. Os dois se conheciam desde a quinta série e eram grandes amigos. Eu nunca havia visto tristeza nos olhos dela até o dia em que Zachary morreu, e eu tinha certeza de que agora esse sentimento era mais frequente em seu semblante. Eu provavelmente estava vivendo o meu próprio desespero e não percebi que minha melhor amiga também sofria com a morte de seu irmão postiço. Ela pigarreou e abriu um meio sorriso. — Meus problemas eram pequenos, Demi. Os seus, não. 
— Olha, quero que você saiba que sempre pode me dizer tudo, Selena — ela se colocou no alto da gangorra. — Quero saber tudo sobre essas aventuras sexuais com o velho Matty. 
— Temos que voltar antes que você seja demitida.
— Se Matty me demitir, as bolas dele vão ficar roxas pelo resto da vida
Selena e eu rimos.
Começamos a andar na direção do café, seu braço agarrado ao meu, nossos pés caminhando juntos. 
— Estou tão feliz por você meio que ter voltado, Demi— murmurou, apoiando a cabeça no meu ombro. 
— Meio que ter voltado? Como assim? Estou aqui, estou de volta. 
Ela olhou para mim com um sorriso sábio. 
— Ainda não. Mas daqui a pouco você chega lá, meu docinho. 
A forma como ela enxergava a minha dor, muito além das aparências, era impressionante. Eu a puxei para perto e, com certeza, não a soltaria tão cedo.

A Selena é puro humor hahaha Amo elas duas juntas <3
Gostaram? Comentem e até o próximo!!!
bjs lindonas <3
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