29/06/2016

certain love: capítulo 16 (Parte 2)


Numa fração de segundo, pulo da cama e vou o mais rápido possível até a porta. 
— Demi, para. 
Continuo andando, até mais rápido quando sinto que Joseph está vindo atrás de mim, viro a maçaneta e desabalo pelo corredor. 
— Por favor, espera um momento, porra! - ele diz, me seguindo, e posso sentir a ofensa aumentando em sua voz. 
Eu o ignoro, ponho a mão no bolsinho de trás do short e tiro minha chave-cartão, enfiando-a na minha porta. Entro e me viro para fechar a porta, mas Joseph já entrou atrás de mim. 
A porta se fecha atrás dele. 
— Quer me escutar? - ele tenta mais uma vez, exasperado. 
Não quero olhar para ele, mas olho mesmo assim. 
Seus olhos estão arregalados, ferozes e sinceros quando finalmente me viro. 
Ele se aproxima de mim e me segura delicadamente pelos braços. E então se curva e aperta suavemente seus lábios contra os meus. Me derreto toda, mas ainda estou confusa demais para reagir adequadamente. Confusa, atordoada e com o coração disparado. 
Ele se afasta e olha para mim, com o rosto totalmente sincero, e inclina a cabeça para o lado... sorrindo. 
— Qual é a graça? - pergunto com voz áspera, e tento me desvencilhar dele. 
Joseph me segura pelos braços e me força a lhe dirigir meu olhar humilhado, que está começando a refletir ressentimento. 
— Falei que não tô interessado em você dessa forma, Demi, porque... - ele faz uma pausa, observando meu rosto, olhando para os meus lábios por um momento, como se estivesse tentando decidir se deve ou não beijá-los de novo — ... porque você não é uma garota com a qual eu conseguiria dormir só uma vez. 
Suas palavras arrancam os pensamentos de mim, e meu coração disparado treme dentro do peito. Não consigo entender o que ele acabou de falar e, em vez de tentar decifrar exatamente o que ele quis dizer, organizo minha mente o melhor que posso e tento recuperar um pouco da compostura que perdi ao me precipitar para fora do quarto. 
— Olha - ele diz, indo para o meu lado e passando a mão na minha cintura por
trás. 
Só sentir seus dedos roçando minha pele causa arrepios naquele lado do meu corpo. Que diabos está acontecendo comigo? Eu quero Joseph... isto é, no momento sinto que não tem mais volta, que eu me obrigaria a ser uma vadia só esta noite para mantê-lo no quarto. Mas o que não entendo é por que sinto que quero dele mais do que sexo... — Demi? - sua voz me faz voltar ao que ele estava tentando dizer momentos atrás. Me fazendo sentar na cama, Joseph agacha na minha frente no chão. Ele me olha nos olhos. 
— Não vou ter uma transa de uma noite só com você, mas vou te fazer gozar, se você deixar. Um pequeno impulso elétrico acaba de atravessar o meu ventre, indo até o meio das minhas pernas. 
— Quê? - não consigo dizer mais nada, na verdade. 
Ele sorri delicadamente, fazendo suas covinhas ficarem só um pouco mais fundas, e encosta os braços dos lados das minhas coxas nuas, segurando minhas ancas com as mãos. 
— Sem compromisso - diz. — Te faço gozar e, amanhã de manhã, quando a gente acordar, estarei no meu quarto aqui ao lado, me preparando pra ir com você pro nosso próximo destino. Nada vai mudar entre a gente, não vou falar do que aconteceu, nem por brincadeira. Vai ser como se nunca tivesse acontecido. 
Mal consigo respirar. Ele acaba de fazer o ponto mais sensível no meio das minhas pernas latejar, só com algumas palavras. 
— Mas... e você? - consigo balbuciar.
 — Eu o quê? 
Ele aperta minhas ancas um pouco mais com as pontas dos dedos. Finjo não notar. 
— Isso não... parece justo. 
Nem sei mais o que estou dizendo. Ainda estou em choque só por isso estar acontecendo. Joseph apenas sorri para mim, nem um pouco abalado pelo meu comentário, e então, de repente, fica de pé e entra no meio das minhas pernas, me fazendo deslizar um pouco para trás na cama. Ele se senta na minha frente e me puxa para o seu colo, com uma perna de cada lado da sua cintura. Meus olhos estão arregalados e estou praticamente mordendo meu lábio inferior. Ele está agindo tão casualmente que só a surpresa de tudo isso me deixa mais molhada. 
Ele passa os braços firmes nas minhas costas e se curva, roçando o meu queixo com a boca. Calafrios tomam conta de mim, dos pés à cabeça. Então ele me puxa para mais perto do seu corpo e sussurra perto da minha boca: — É justo. Eu quero te fazer gozar e, pode acreditar, com certeza também vou ganhar alguma coisa com isso - sinto o sorriso em sua voz, olho nos seus olhos e não consigo resistir. Se Joseph me mandasse virar e ficar de quatro para ele, eu obedeceria sem hesitação. 
Ele roça o outro lado do meu rosto com os lábios. 
— Então por que você não dorme comigo e pronto? - pergunto baixinho, mas depois tento escolher melhor as palavras. — Tipo, se você quiser fazer... mais alguma coisa comigo... 
Ele afasta o rosto e põe três dedos sobre meus lábios para me calar. 
— Vou dizer isto só uma vez - ele começa, e seus olhos parecem abismos agitados pela intensidade. — Mas não quero que você faça nenhum comentário quando eu disser, tá? Balanço a cabeça nervosamente. 
Ele para, molha os lábios com a língua e então diz: — Se você me deixasse transar com você, teria que me deixar possuí-la de corpo e alma. 
Uma onda de prazer irrestrito estremece meu corpo todo. O choque de suas palavras me põe em submissão na hora. Meu coração está mandando dizer uma coisa. Minha mente está mandando dizer outra. Mas eu não consigo ouvir porra nenhuma que os dois estão dizendo por causa dessa sensação no meio das minhas pernas que está ficando cada vez mais impossível de ignorar. 
Engulo com força, procurando desesperadamente alguma saliva. Parece que toda parte do meu corpo que normalmente produz líquidos parou de funcionar, porque todo o líquido foi redirecionado para aquele lugar no meio do meu corpo. 
Ainda não consigo respirar. 
Meu Deus, ele ainda nem me tocou e eu já me sinto assim? 
Estou sonhando? 
— Mas e se eu bater uma punheta pra você ou algo assim? 
Admito, essa ideia está fazendo com que eu me sinta culpada. 
Ele inclina a cabeça para um lado, sorrindo, e fico com vontade de beijá-lo sofregamente. 
— Eu falei pra você não comentar. 
— Eu-eu... bom, não comentei o que você falou, na verdade, só... - ele enfia os dedos por baixo do tecido fino da minha calcinha e me toca. Gemo e esqueço o que tinha começado a dizer.
— Quieta - Joseph ordena delicadamente, embora esteja falando completamente a sério. Meus lábios ficam selados e eu gemo de novo quando ele enfia dois dedos dentro de mim e os mantém lá, com o polegar apertando meu osso da pélvis por fora. — Vai ficar quieta, Demi? 
Eu balbucio a palavra s-sim e mordo o lábio inferior. 
Então seus dedos saem de dentro de mim. Quero implorar para que não os tire, mas ele me mandou ficar quieta de uma maneira que me deixa totalmente louca por ele e igualmente submissa, por isso não digo nada. Abro os olhos cuidadosamente quando ele passa os dedos molhados nos meus lábios, e instintivamente os lambo, só um pouco, até que ele os aproxima de seus próprios lábios e sorve o resto de mim com sua língua. Eu me curvo para ele, tocando sua boca com a minha, fechando os olhos devagar, só querendo sentir seu sabor e o meu nele. Sua língua serpenteia para tocar a minha, mas então ele me empurra delicadamente de volta para a cama, em vez de ceder ao beijo afoito que quero tão desesperadamente. 
Joseph enfia as duas mãos no tecido ao redor da minha cintura e tira meu short e minha calcinha, largando-os em algum lugar no chão. 
Depois sobe na cama e se deita ao meu lado, passando um braço sobre o meu corpo e enfiando a mão por baixo da minha camiseta. Não pus o sutiã mais cedo. Ele aperta suavemente um mamilo, depois o outro, e beija o meu queixo de novo. Cada pelinho da minha nuca fica de pé quando sua língua contorna a curva da minha orelha. 
— Quer que eu toque nela? - seu hálito é quente no lado do meu rosto. 
— Sim - gemo. 
Ele prende o lóbulo da minha orelha entre os dentes e sua mão começa a descer pela minha barriga, mas para na altura do meu umbigo. 
— Me diz que você quer que eu toque - Joseph suspira no meu ouvido. 
Mal consigo abrir os olhos. 
— Eu quero que você toque... 
Ele desliza mais a mão e meu coração começa a pular ferozmente no peito, mas quando acho que ele vai me tocar, sua mão vai para a parte de dentro da minha coxa. 
— Abre as pernas pra mim - deixo minhas pernas caírem devagar, mas ele as abre mais com a mão, seus dedos forçando minha carne até me deixar completamente exposta. 
Ele se ergue do meu lado e se curva sobre meu corpo, puxando minha camiseta para expor meus seios, e então prende meus mamilos entre os dentes, um depois do outro.
Depois passa a ponta da língua úmida sobre os dois e põe a boca neles, beijando sofregamente um de cada vez. Enfio os dedos no seu cabelo, querendo agarrá-lo e puxá-lo, mas não faço isso. Joseph segue pelo meu tórax, descendo pelas costelas, traçando cada uma com a língua antes de chegar ao umbigo. 
Ele olha para mim com olhos semicerrados e dominantes e diz, com os lábios pressionados de leve contra a minha barriga: — Você precisa me dizer o que quer, Demi - ele lambe minha barriga uma vez, tão lentamente que minha pele fica ondulada com os tremores. — Não vai ganhar nada se não me disser e não me fizer acreditar em você. 
Inspiro sem forças, sentindo meu peito literalmente chocalhar. 
— Por favor, por favor, me toca... 
— Não acredito em você - Joseph diz provocativamente, e lambe meu clitóris uma vez. Só uma vez. Ele para e me olha por cima da paisagem do meu corpo, esperando por mim. 
Como tenho medo de dizer a palavra, sussurro tão baixinho: — Por favor... quero que você chupe minha boceta.
— Como é? - ele pergunta e lambe meu clitóris de novo, desta vez demorando um pouco mais, e sinto uma onda de calafrios lá embaixo. — Não ouvi direito. 
Digo de novo, levantando a voz só um pouco, ainda constrangida em dizer aquela palavra proibida, que sempre achei suja, errada e digna só dos filmes pornôs. 
Joseph enfia a mão entre minhas pernas e abre meus lábios com dois dedos. Ele me lambe uma vez. Só uma vez. Minhas coxas estão começando a tremer mais. 
Não sei quanto tempo mais posso esperar. 
— Uma mulher que sabe o que quer no sexo - ele me lambe de novo, sempre me olhando com os olhos semicerrados. — E não tem medo de dizer, dá um puta tesão, Demi... Diz. O. Que. Você. Quer. Senão eu não dou - ele me lambe de novo e eu não aguento mais. 
Estendo as mãos e o seguro pelo cabelo, empurrando seu rosto para o meio das minhas pernas, o quanto ele me permite, e digo, olhando nos seus olhos: — Chupa a minha boceta, Joseph; puta que pariu, chupa a porra da minha boceta! 
Percebo o sorriso mais sinistro que já vi em seu rosto, pouco antes que minhas pálpebras se fechem e minha cabeça vá para trás quando ele começa a me lamber, sem parar desta vez. Ele chupa com força o meu clitóris e tira e põe os dedos em mim ao mesmo tempo, e penso que vou desmaiar. Não consigo abrir os olhos, parecem ébrios de prazer. Levanto os quadris na direção dele e quase arranco seu cabelo, mas ele não perde o ritmo. Me lambe com força e rápido e de vez em quando diminui a velocidade para me chupar e passar o polegar no meu clitóris intumescido, antes de mergulhar a língua novamente. E quando começo a sentir que não vou aguentar mais e tento deslizar para longe do seu rosto, ele agarra minhas coxas e me força a ficar parada até que eu gozo com violência, minhas pernas tremendo
incontrolavelmente, minhas mãos segurando sua cabeça com todas as forças. Um gemido escapa dos meus lábios e eu ergo os dois braços acima da cabeça, agarrando a cabeceira da cama com as pontas dos dedos, tentando me apoiar para fugir da língua implacável de Joseph. Mas ele me segura com mais força, com as mãos fechadas em volta das minhas coxas, acima dos quadris, faz tanta pressão que dói, crava as pontas dos dedos na minha pele, mas eu gosto. 
E quando meu corpo trêmulo principia a se acalmar e minha respiração ofegante vai ficando mais lenta, embora ainda irregular, Joseph também começa a me lamber mais suavemente. Quando meu corpo para de se mexer, ele beija o lado de dentro das minhas coxas e a região logo abaixo do meu umbigo, antes de se esgueirar para cima rumo à minha boca, apoiando os braços rijos e musculosos no colchão de cada lado do meu corpo. Seus lábios macios e úmidos pousam no meu pescoço e nos dois lados do meu maxilar primeiro, depois na minha testa. Por último, ele me olha nos olhos por um longo momento e depois se curva e beija meus lábios de leve. 
E então ele se levanta da cama. 
Não consigo me mexer.
Quero esticar os braços, agarrá-lo e puxá-lo para cima de mim, mas não consigo me mexer. Não só ainda estou atordoada pelo orgasmo que ele acaba de provocar, mas minha mente ainda está atordoada por toda a experiência. 
Fico só olhando para ele, mal erguendo a cabeça do travesseiro, vendo-o ir até a porta. Ele me olha uma vez depois de pôr a mão na maçaneta. 
Mas sou eu que falo primeiro: 
— Aonde você vai? 
Sei aonde ele está indo, mas foi a única coisa em que consegui pensar para segurá-lo mais um pouco. 
Ele sorri delicadamente.
 — Pro meu quarto - responde, como se eu já devesse saber. 
A porta se abre e a luz do corredor inunda o espaço ao redor dele, iluminando sua silhueta nas sombras. Quero dizer alguma coisa, mas não sei bem o quê. Ergo as costas da cama e me sento, meus dedos mexem no lençol no meu colo, nervosos. 
— Bom, a gente se vê de manhã - Joseph diz, e dá um último sorriso significativo antes de fechar a porta atrás de si, fazendo a luz do corredor desaparecer. Mas meu quarto está bem iluminado, deixei o abajur ao lado da cama aceso. Olho para o lado, pensando na lâmpada. Estava acesa o tempo todo. Sempre fui meio tímida na cama, e mesmo com Wilmer, o máximo de luz com a qual fiz sexo foi de uma tela de TV, mas nunca uma luz forte. Nem pensei nisso, desta vez.
E as palavras que saíram da minha boca... nunca falei nada parecido antes. Aquela palavra que começa com B não. Não consigo dizer nem agora. Claro que já falei para Wilmer “me fode” ou “me fode mais forte”, mas essa era toda a extensão do meu vocabulário pornográfico. 
O que Joseph Jonas está fazendo comigo? 
Seja o que for... acho que não quero que pare. 
Me levanto da cama, visto a calcinha e o short e ando até a porta, determinada a ir até lá e... não sei o que mais. 
Paro na porta antes de abri-la e olho para meus pés descalços sobre o carpete verde. 
Não sei o que eu iria dizer se fosse lá, porque não sei nem o que quero ou o que não quero. Então deixo meus braços caírem dos lados do corpo, e um suspiro profundo me escapa dos lábios. 
— Como se nunca tivesse acontecido - digo secamente, imitando-o. — Sei. Você não é bom o bastante pra conseguir isso. 

O que acharam? Joseph enlouquecendo a Demi hahaha
Não teve beijo, mas prometo que o capítulo disso acontecer ta perto e o de hot também...espero que tenham gostado!!!
Comentem, bjs lindonas <3

28/06/2016

certain love: capítulo 16 (Parte 1)


Eu me odeio por ter deixado Joseph sair por aquela porta, mas era necessário. Não posso fazer isso. Não posso me deixar cair no mundo que é Joseph Jonas, embora tudo no meu coração e nos meus desejos me peça isso. Não é só questão de ter medo de sofrer de novo; todos passam por essa fase, e talvez eu ainda não a tenha superado completamente, mas são tantas outras coisas. 
Eu não me conheço.
Não sei o que quero, como me sinto ou como deveria me sentir, e acho que nunca soube, na verdade. Seria uma vaca egoísta se deixasse Joseph entrar na minha vida. E se ele se apaixonar, ou quiser algo de mim que não posso dar? E se eu acrescentar um coração partido à morte do pai dele? Não quero a dor dele na minha consciência. 
Me viro de repente e olho para a porta outra vez, lembrando a expressão de Joseph antes que saísse. 
Talvez essa nem seja a questão. Quanta pretensão minha até considerar a ideia de ele se apaixonar por mim. Talvez ele queira apenas uma amizade colorida ou uma simples transa. Minha cabeça está rodando com um turbilhão caótico de pensamentos, nenhum dos quais acho certo, e sei que todos são possíveis. Ando até o espelho e me olho nele, olho nos olhos de uma garota que sinto que conheço, mas da qual nunca me tornei verdadeiramente íntima. Me sinto realmente separada de mim mesma, de tudo. 
Foda-se! 
Cerro os dentes e bato com as mãos abertas na mesinha da TV. Depois pego o novo short preto, minha nova camiseta branca com je t’aime escrito em letra cursiva ao redor da Torre Eiffel, e vou para o chuveiro. Fico uma eternidade debaixo do jato d’água, não porque me sinto suja, mas porque me sinto uma merda. Só consigo pensar em Joseph. E em Wilmer. E em por quê, afinal, sinto essa necessidade estranha e provocante de pensar nos dois ao mesmo tempo. 
Depois que a água quente parece ter arrancado minha primeira camada de pele, saio e me enxugo, ensopando a toalha com meu cabelo. Uso o secador nua, na frente do espelho, e depois volto para o quarto para me vestir, porque não levei uma calcinha limpa para o banheiro. Finalmente, penteio meu cabelo ainda úmido e o deixo terminar de secar naturalmente, passando-o atrás das orelhas para que não caia no rosto. 
Ouço Joseph tocando violão através da parede de novo. A tv continua tagarelando e aquilo me irrita, por isso me levanto, pisando duro, e desligo o aparelho para ouvir Joseph melhor.
Fico ali por alguns segundos, absorvendo as notas que atravessam a parede e chegam dolorosamente aos meus ouvidos. Não é uma música triste, mas por algum motivo acho doloroso mesmo assim. 
Finalmente, pego minha chave, enfio os pés nos chinelos e saio do quarto. 
Passando nervosamente a língua nos lábios ressecados, respiro fundo, engulo em seco e levanto a mão para bater de leve em sua porta. 
O som do violão se interrompe, e alguns segundos depois a porta se abre com um estalo. 
Ele também tomou banho. Seu cabelo ainda está molhado; tem uns fios bagunçados na testa. Ele me olha, sem camisa e usando apenas um short de lona preta. 
Tento não olhar para sua barriga de tanquinho levemente bronzeada, nem para as veias que correm por seus braços e de certa forma parecem mais pronunciadas, com o resto de sua pele à mostra. 
Oh... meu Deus. Talvez seja melhor eu voltar... 
Não, eu vim pra conversar com ele e é isso que vou fazer. 
Ele sorri delicadamente para mim. 
— Tudo começou mais ou menos há um ano e meio - começo a contar sem rodeios. — Uma semana antes da formatura. Meu namorado morreu num acidente de carro. 
Seu sorriso suave desaparece e seus olhos ficam mais meigos, só o suficiente para mostrar que ele lamenta por mim, sem que isso pareça falso ou exagerado. 
Joseph termina de abrir a porta e eu entro. A primeira coisa que ele faz, mesmo antes que eu me sente no pé da cama, é vestir uma camiseta. Talvez não queira que eu pense que está tentando me distrair ou me paquerar, especialmente quando fui lá para contar algo obviamente doloroso. Eu o respeito ainda mais por isso. Esse gesto pequeno e aparentemente insignificante vale por mil palavras, e por mais que seja uma pena vê-lo esconder aquele corpo, eu aceito. Não foi para isso que vim.
Eu acho... 
Há uma espécie de tristeza genuína em seus olhos esverdeados, misturada com algo de consideração. Joseph desliga a TV e se senta ao meu lado, do mesmo jeito que se sentou na minha cama, e me olha, esperando pacientemente que eu continue.
— A gente se apaixonou com 16 anos - continuo, olhando para a frente. — Mas Wilmer esperou dois anos... dois anos - olho para ele para enfatizar. — Até que eu dormisse com ele. Não sei de nenhum adolescente que esperaria tanto tempo pra transar com uma garota.
Joseph faz cara de quem concorda. 
— Tive uns namoros curtos antes de Wilmer, mas os garotos eram tão... - olho para cima, procurando a palavra certa — ... mundanos. Pra dizer a verdade, com 12 anos eu já tinha começado a achar que um monte de gente era mundana.
Joseph parece refletir, com o cenho levemente franzido. 
— Mas Wilmer era diferente. A primeira coisa que ele me disse, depois que a gente se conheceu e conversou de verdade, foi: “Eu queria saber se o oceano tem um cheiro diferente do outro lado do mundo.” Primeiro eu ri, porque achei que era uma coisa esquisita pra se falar, mas depois percebi que aquela simples frase o diferenciava de todo mundo que eu conhecia. Wilmer era um cara que estava do lado de fora, olhando pra todos nós correndo pra lá e pra cá, fazendo as mesmas coisas todo dia, seguindo os mesmos caminhos, feito formigas num formigueiro de vidro.  E eu sempre soube que queria algo mais da vida, algo diferente, mas foi quando conheci Wilmer que as coisas começaram a ficar claras pra mim.
Joseph sorri com ternura e diz: 
— Resolvida e madura antes do 20 anos...isso é raro
 — É, acho que sim - concordo, sorrindo para ele, e continuo, soltando uma risadinha: — Você nem acreditaria o quanto Damon, Selena ou até minha mãe e meu irmão, Cole, ficavam me enchendo por eu ser tão “cabeça” - faço aspas com os dedos ao dizer “cabeça” e reviro os olhos. 
— Ser cabeça é bom - Joseph afirma, e olho disfarçadamente, porque detecto a atração, embora ele a esteja domando muito bem, em nome da conversa. Mas então seu sorriso desaparece e sua voz fica um pouco mais baixa. — Então, quando você perdeu Wilmer, perdeu seu parceiro no crime. 
Meu sorriso também desaparece e eu apoio as mãos na beirada da cama, deixando meu corpo afundar entre os ombros. 
— Sim. A gente iria mochilar pelo mundo depois da formatura, ou talvez só pela Europa, mas tava decidido, isso já tava planejado, pelo menos - olho diretamente para Joseph, agora. — A gente sabia que não queria fazer uma faculdade e acabar trabalhando 40 anos no mesmo emprego, a gente queria trabalhar em todo lugar, tentar tudo, botar o pé na estrada! Joseph ri.
— Na verdade, é uma ideia muito legal - ele observa. — Uma semana você tá de garçonete num bar, juntando gorjetas, e na seguinte, em outra cidade, fazendo dança do ventre numa esquina e os turistas passando e jogando moedas num pote. 
Meus ombros caídos balançam um pouco com o riso e fico vermelha, olhando para ele. 
— Garçonete, tudo bem, mas dança do ventre? - balanço a cabeça. — Menos. 
Ele abre um sorriso e protesta: 
— Ah, você conseguiria. 
Ainda com o rosto quente e vermelho, olho para a frente e espero voltar ao normal. 
— Seis meses depois que Wilmer morreu - continuo.  — Meu irmão, Cole, matou um sujeito num acidente ao dirigir bêbado, e agora tá na prisão. E depois disso, meu pai traiu minha mãe e eles se divorciaram. Meu novo namorado, Christian, me traiu. E, claro, você já sabe o que aconteceu com Selena. 
Isso é tudo. Contei todas as coisas que, juntas, me fizeram querer fugir. Mas não consigo olhar para ele porque sinto que não deveria ser só isso, como se ele estivesse pensando: Tá, e cadê o resto? 
— É muita coisa caindo no colo de uma pessoa só - Joseph diz, e volto a erguer o olhar quando sinto que ele está se ajeitando na cama perto de mim. Sinto seu hálito de hortelã, agora que ele virou o corpo completamente para o meu lado. — Você tem todo o direito de estar magoada, Demi. 
Não digo nada, mas agradeço com os olhos. 
— Acho que agora entendi por que não foi difícil te convencer a fazer esta viagem comigo - ele continua. 
Seu rosto é indecifrável. Espero que ele não pense que o estou usando para fazer uma imitação daquela parte da minha vida que planejei com Wilmer. Toda a situação de cair na estrada é parecida, até para mim, agora que penso a respeito, mas o que me levou a partir com ele não poderia ser mais diferente. Estou com Joseph agora porque quero estar. 
É nesse momento que me dou conta de que não penso tanto em Wilmer e Joseph por estar tentando achar Wilmer em Joseph... acho que é a culpa... talvez eu esteja tentando substituir Wilmer completamente. 
Levanto da cama e tiro essas ideias da cabeça. 
— E o que você vai fazer? - Joseph pergunta atrás de mim. — Depois que esta viagem acabar, o que planeja fazer da vida?
Meu coração endurece no peito. Nem uma vez durante a viagem com Joseph, ou mesmo antes de conhecê-lo, depois que saí da Carolina do Norte, pensei além do presente. Não foi nem questão de tentar não pensar no que viria; simplesmente não pensei e pronto. A pergunta de Joseph me acorda e agora me sinto em pânico. Nunca quis uma dose dessa realidade; estava satisfeita com minha ilusão. 
Eu me viro, com os braços cruzados sobre o peito. Os lindos olhos de Joseph me fitam intensamente. 
— Eu... na verdade, não sei. 
Ele parece um pouco surpreso, seu olhar se torna mais contemplativo e seus olhos vagam.
 — Você ainda pode fazer faculdade - ele sugere, oferecendo ideias para que eu me sinta melhor, acho. — E isso não significa que você vai precisar arranjar um emprego em seguida e trabalhar nele até morrer. Caramba, você ainda pode mochilar pela Europa, se quiser. Joseph se levanta comigo. Posso ver que as engrenagens estão girando na sua cabeça enquanto ele anda um pouco pelo carpete verde-escuro. 
— Você é linda - diz, e meu coração palpita. — É inteligente, e obviamente mais determinada do que a média das garotas, acho que poderia fazer o que você quisesse. Porra, sei que parece um lugar-comum, mas não pode ser mais verdadeiro no teu caso. 
Dou de ombros. 
— Acho que sim - reflito. — Mas não tenho a menor ideia do que eu quero, a não ser que não quero voltar pra casa pra ficar pensando nisso. Acho que meu medo de voltar pra lá é me afundar na mesma bosta da qual saí quando subi no ônibus naquele dia. 
— Me diz uma coisa - Joseph pergunta de repente, e meus olhos voltam para ele. — Qual é a coisa mais frustrante pra você na convivência com o resto do mundo? 
Mais frustrante? 
Penso nisso por um segundo, meu olhar fixo no abajur de cobre preso à parede ao lado da cama. 
— Eu... não tenho certeza. 
Joseph se aproxima de mim e apoia dois dedos no meu braço, me guiando para sentar novamente com ele, e eu obedeço. 
— Pensa um pouco - ele continua. — Baseada no que você já me contou, qual a diferença entre você e eles? 
Odeio saber que estou demorando para entender alguma coisa que ele parece já ter pensado. Olho para minhas mãos no meu colo e penso muito, profundamente, até que me vem a única resposta que sinto que pode ser a certa, mas ainda não estou totalmente convencida. 
— Expectativas? 
— Isso é uma pergunta ou a sua resposta? 
Desisto. 
— Não sei direito, tipo, me sinto... limitada perto de qualquer pessoa, a não ser de Wilmer, claro. 
Ele balança a cabeça e me ouve, me deixando falar sem interromper enquanto a resposta está se formando na minha mente. 
E então, do nada, as respostas vêm: 
— Ninguém quer fazer as mesmas coisas que eu - começo, e minha explicação sai mais rapidamente, agora que tenho mais confiança na resposta. — Como esse lance de viver livre e não seguir o caminho normal, sabe? Ninguém quer sair da sua zona de conforto pra fazer isso comigo, porque não é o que a maioria das pessoas faz. Eu tinha medo de contar pros meus pais que não queria ir pra faculdade, porque era isso que eles esperavam que eu fizesse. Aceitei um emprego numa loja de departamentos porque minha mãe esperava que ele fosse me realizar de alguma forma. Ia com a minha mãe todo sábado visitar meu irmão na prisão porque ela esperava que eu fosse, porque ele é meu irmão e eu deveria querer vê-lo, embora não quisesse. Selena tentava incansavelmente me arrumar um cara porque achava anormal eu não ter ninguém. 
Acho que tive medo de ser eu mesma a maior parte da minha vida.” 
Viro a cabeça na direção de Joseph. 
— De certa forma, era assim até com Wilmer. 
Desvio o olhar rapidamente porque essa última parte não era algo que eu realmente esperava dizer em voz alta. Escapou enquanto a revelação se formava tão rápido na minha mente. 
Joseph parece curioso, mas ao mesmo tempo sem saber se deve perguntar mais. 
Não sei bem se devo entrar em detalhes.
Ele assente com a cabeça. 
Pelo jeito, decidiu que não tem o direito de avançar nesse assunto específico. 
Joseph morde a bochecha por dentro. Eu o observo por um momento, sempre tentando aplacar a atração óbvia que sinto, mas está ficando mais difícil. Olho para seus lábios e me pergunto que sabor teriam. E então me obrigo a desviar os olhos, estou fazendo isso de novo. Agora mesmo. Estou com medo de lhe dizer o que quero. Ou ao menos o que acho que quero. 
— Joseph - digo, e seu rosto reage silenciosamente à minha voz pronunciando o seu nome. Pensa nisso, Demi, digo a mim mesma. Tem certeza que é isso que você quer? 
— O que é? - ele pergunta. 
— Você já teve uma transa de uma noite só? 
É como se eu deixasse escapar o maior segredo que já me contaram, diante de um microfone, numa sala cheia de gente. Mas agora já foi. Ainda nem tenho certeza absoluta de que é o que quero, mas está na minha cabeça já há algum tempo. Lembro vagamente que pensei nisso enquanto estava naquele teto com Blake.
O rosto de Joseph perde toda a emoção e ele parece não conseguir encontrar palavras para dizer. Instantaneamente, meu coração para e chego a sentir náuseas. 
Sabia que não devia ter dito isso, ele vai achar que sou uma vadia ou algo assim. 
Me levanto da cama num pulo. 
— Desculpa, meu Deus, você deve me achar uma... 
Ele estende a mão e me segura pelo pulso. 
— Senta aí. 
Relutantemente, me sento, mas não consigo olhar para ele. Estou com uma puta vergonha. — Qual o teu problema? - Joseph pergunta. 
— Hã? 
Olho para ele. 
— Você tá fazendo isso agora mesmo - ele mexe as mãos para enfatizar o “agora mesmo”, seu cenho está franzido. 
— Fazendo o quê? 
Ele passa a língua nos lábios, suspira como se estivesse decepcionado e finalmente explica: — Demi, você começou a me contar algo que deve ter considerado uma ou duas vezes, e quando enfim tomou coragem pra dizer o que tinha em mente, deu meia-volta e se arrependeu - Joseph me olha fundo nos olhos, os dele cheios de intensidade e conhecimento e mais alguma coisa que ainda não consigo decifrar. — Faz a pergunta de novo e, desta vez, espera a minha resposta. 
Fico em silêncio, analisando aquela expressão incerta em seu rosto, me sentindo insegura por causa dela. Ou talvez esteja apenas insegura comigo mesma. 
Engulo em seco e digo: 
— Você já teve uma transa de uma noite só? 
Sua expressão não muda nem desanima. 
— Sim, já tive algumas. 
Ele está esperando por mim, agora, embora eu ainda não saiba ao certo como ficar à vontade nessa conversa cada vez mais embaraçosa. É como se Joseph soubesse que estou me retorcendo por dentro, mas, para me ensinar uma lição, vai me obrigar a falar, em vez de bancar meu analista, como fez desde que entrei no quarto dele. 
Suas sobrancelhas se erguem um pouco, como que para dizer: E então? 
— Bom, eu só tava querendo saber... porque nunca fiz nada assim. 
— Por que não? - ele pergunta, tão casualmente. 
Olho para baixo, depois levanto os olhos novamente para que ele não me repreenda por isso. — Bom, acho que é meio coisa de vadia, só isso. 
Joseph ri e isso me surpreende. 
Finalmente, ele alivia um pouco minha tortura. 
— Se uma garota faz muito isso - ele encomprida a palavra “muito”, com um sorriso enojado. — Aí vira coisa de vadia, claro. Uma vez ou outra, não sei... - ele mexe as mãos na altura dos ombros, como que pensando em números, indeciso. — Não tem nada de errado. 
Por que ele não se aproveita disso totalmente agora mesmo? Começo a sentir um pouco de pânico, me perguntando por que ele ainda está bancando o analista em vez de partir para a sedução e ir logo ao que interessa. 
— Tá, então... 
Não consigo dizer. Simplesmente não é minha cara conseguir falar casualmente sobre qualquer coisa sexual minha. Só consigo vagamente com Selena. 
Andrew suspira e seus ombros afundam. 
— Você quer dormir comigo, quer ter uma transa de uma noite só comigo? - ele sabia que eu não iria ter coragem de falar, então cedeu e falou por mim. 
A pergunta, embora óbvia para ambos, tira meu fôlego. Partindo dele, é tão embaraçosa e constrangedora quanto se tivesse partido de mim, ou mais até. 
— Talvez...
Ele se levanta, olha para mim e diz: 
— Desculpa, mas não tô interessado em você dessa forma. 
O maior soco do mundo acaba de me atingir em cheio no estômago. Minhas mãos ficam rígidas, agarrando a borda do colchão, deixando meus braços completamente imóveis até os ombros. Tudo o que quero agora é sair correndo por aquela porta, me trancar no meu quarto e nunca mais ver Joseph. Não porque não queira vê-lo, mas porque não quero que ele me veja. 
Nunca fiquei tão envergonhada em toda a minha vida. 
E é isso que eu ganho por dizer o que penso! 
Não sei se devo aceitar como uma lição ou odiar Joseph por ter me colocado nessa posição.

Ainda bem que a Demi contou o que aconteceu com Wilmer!!!
E esse final? O que acham que vai acontecer?
Comentem, bjs lindonas <3

27/06/2016

certain love: capítulo 15


Quando eu conseguia manter os olhos abertos por tempo suficiente, olhava para a chuva martelando meu rosto. Nunca tinha visto a chuva daquele jeito, olhando direto para o céu, e mesmo me encolhendo mais do que realmente olhando, quando eu conseguia, era absolutamente lindo. Como se cada pingo se precipitando na minha direção fosse separado dos milhares de outros e, por um momento suspenso no tempo, eu pudesse vislumbrar todas as suas delicadas facetas. Eu via as nuvens cinzentas se movendo acima de mim e sentia o carro balançar quando o vento dos veículos o atingia. 
Eu tremia, embora estivesse quente o bastante para nadar. Mas nada do que eu via, sentia ou ouvia era mais quente e fascinante do que a proximidade de Joseph. 
Grito e rio quando voltamos para dentro do carro, minutos depois. 
Bato a porta, e ele bate a dele em seguida. 
— Tô congelando! - rio e tremo, apertando os braços erguidos entre os seios, cruzando os dedos com força e apoiando o queixo neles. 
Joseph, com um sorriso tão largo que cobre todo o seu rosto, estremece e liga a calefação. Instintivamente, tento esquecer que fiquei deitada sobre o braço dele, ou que ele o estendeu para que eu deitasse. Acho que ele também tenta esquecer, ou ao menos não deixar isso óbvio. 
Ele esfrega as mãos, tentando se aquecer com o calor que sai dos respiros de ventilação. Meus dentes estão batendo. 
— Usar roupa molhada é um saco - digo, com o queixo tremendo. 
— É, tô contigo nisso - ele diz, puxando o cinto de segurança e afivelando-o. 
Faço o mesmo, embora, como sempre, depois de ficar no carro por muito tempo, vou acabar me desvencilhando dele para encontrar alguma outra posição confortável. 
— Meus dedos dos pés estão enlameados - ele comenta, olhando para os tênis. 
Meu rosto todo desmorona. Ele ri e depois tira os tênis, jogando-os no assoalho do banco de trás. 
Decido fazer o mesmo porque, mesmo eu não querendo admitir, meus pés também estão enlameados. 
— A gente precisa encontrar um lugar pra trocar de roupa - declaro. 
Joseph põe o câmbio em drive e olha para mim. 
— Tem o banco de trás - diz, sorrindo. — Não vou espiar, juro - ele levanta as mãos para enfatizar isso e depois segura o volante de novo, voltando para a estrada quando aparece uma brecha no trânsito. 
Rio com desdém. 
— Não, acho que vou esperar até a gente encontrar um lugar. 
— Como quiser. 
Eu sei que ele iria olhar, com certeza. E, bem, isso nem iria me incomodar muito... 
Os limpadores do para-brisa deslizam de um lado para o outro na velocidade máxima, e está chovendo tanto que mesmo assim é difícil enxergar a estrada adiante. Joseph deixa a calefação ligada até que o carro começa a parecer uma sauna, e antes de desligá-la, verifica se já estou aquecida. 
— Então, Hotel California, é? - pergunta, sorrindo para mim com covinhas bem fundas. Ele aperta o botão de seleção de CDs até encontrar a canção. — Vamos ver o quanto você sabe. Sua mão volta para o volante. 
A canção começa como sempre lembrei, com aquela guitarra lamuriosa, lenta e perturbadora. Olhamos um para o outro, deixando a música se mover entre nós dois e nos atravessar, esperando a letra começar. Então, ao mesmo tempo, levantamos as mãos como que marcando no ar um, dois, três no ritmo e começamos a cantar com Don Henley. Cantamos com afinco, verso após verso, e às vezes revezamos, ele me deixa cantar um verso e canta o seguinte. E quando o primeiro refrão começa, cantamos juntos a plenos pulmões, praticamente gritando a letra para o para-brisa. Semicerramos os olhos, inclinamos a cabeça e eu finjo que não estou morta de vergonha com meu jeito de cantar. Então vem a segunda estrofe e nosso revezamento começa a ficar um pouco embolado, mas nos divertimos muito e só nos atrapalhamos algumas vezes. E gritamos 1969! bem alto juntos. Então perdemos um pouco do entusiasmo pela cantoria e só deixamos a música encher o carro. Mas quando o famoso segundo refrão chega e a música fica mais lenta e perturbadora, ficamos sérios de novo e cantamos cada palavra juntos, olhando um para o outro. Joseph canta “alibis!” com tanta perfeição que meus braços ficam arrepiados. E ambos “apunhalamos a fera” juntos, dando socos no ar e entrando no clima da música. 
E foi assim a viagem sei lá para onde pelas horas seguintes. 
Cantei tanto com ele que minha garganta começou a doer. 
Naturalmente, era tudo rock clássico, ocasionalmente com algum som do início dos anos 90: sobretudo Alice in Chains e Aerosmith, e não me incomodei nem um pouco com isso. Na verdade, adorei tudo, e adorei as lembranças que estavam se formando na minha mente. Lembranças com Joseph. 
Encontramos uma área de descanso à beira da estrada em Jackson, Tennessee, e tiramos o máximo proveito dela. Usamos os banheiros para trocar as roupas molhadas, que vestíamos há mais tempo do que tínhamos percebido. Acho que nos divertimos tanto no carro, com minha cantoria não exatamente espetacular, e ele fingindo que adorava, que nos distraímos de todo o resto. 
Joseph termina de se vestir antes de mim e já está esperando dentro do carro quando saio usando as únicas roupas limpas que sobraram na minha mala: o shortinho branco e a camiseta do time do colégio que gosto de usar para dormir. Só trouxe um sutiã, o que estava usando quando choveu, por isso ele ainda está completamente úmido. Mas eu o uso da mesma forma, porque de jeito nenhum vou entrar naquele carro com Joseph sem sutiã. 
— Eu não tô usando este shortinho pra te agradar - digo, apontando severamente para ele ao entrar no carro. — Entendeu? 
O canto de seus lábios se ergue num sorriso. 
— Recado recebido - ele diz, escrevendo numa prancheta imaginária. 
Levanto a bunda do assento e agarro o fundilho do meu short, puxando-o só um pouco para que não fique enfiado na minha virilha e cubra um pouco mais de pele das minhas coxas. Começo a tirar meus chinelos pretos, mas vejo como o tapetinho do carro está enlameado e decido ficar com eles. Ainda bem que os bancos são de couro. 
— Vou ter que procurar mais roupas - comento. 
Joseph está usando jeans de novo, suas botas Dr. Martens pretas e outra camiseta cinza lisa, mais clara do que a anterior. Como tudo o mais, fica ótima nele, mas meio que sinto falta de suas panturrilhas musculosas. 
— Por que você só trouxe isso? - ele pergunta, conservando os olhos na estrada. — Não que eu esteja reclamando, claro. 
Sorrio para ele. 
— Como eu não sabia pra onde tava indo, achei que não iria querer ficar carregando um monte de tralhas. 
— Faz sentido. 
O sol brilha no Tennessee, e agora rumamos para o sul. O outro lado da estrada está congestionado por causa de obras, e ambos expressamos o quanto estamos contentes de não estar “daquele lado da estrada”. Por fim, a luz do dia desaparece por trás do horizonte e o crepúsculo banha as plantações de arroz e algodão com uma névoa violeta; há sempre algum tipo de plantação gigantesca dos dois lados da estrada, a perder de vista. 
Chegamos em Birmingham, Alabama, pouco depois das 19h. 
— Onde você quer comprar roupas? - Joseph pergunta, rodando devagar por uma rua cheia de sinais de trânsito e postos de gasolina.
Ergo o corpo do assento e olho ao redor, tentando encontrar entre os letreiros luminosos algum lugar aceitável. 
Joseph aponta para a frente. 
— Tem um Walmart ali. 
— Acho que serve - respondo, e ele vira à esquerda no semáforo e entramos no estacionamento. 
Saímos do carro, e a primeira coisa que faço é puxar minha calcinha de dentro da bunda. 
— Precisa de ajuda? 
— Não! - respondo rindo. 
Andamos juntos no meio do mar de carros do estacionamento, meus chinelos batendo nos calcanhares. Me encolho na hora, sabendo que devo estar ridícula com uma trança suja e empaçocada sobre o ombro e usando este shortinho minúsculo que fica entrando na minha bunda. Nada mais de maquiagem depois que a cerimônia de comunhão com a chuva lavou tudo. Mantenho os olhos no chão branco reluzente enquanto andamos pela loja e evito cruzar olhares com os outros. 
Vamos primeiro para a seção de roupa feminina e eu pego algumas coisas simples: outro short de algodão, curtinho também, mas não enfiado na bunda como o que estou usando, e algumas camisetas fofas com gola em V e estampas aleatórias. Contenho o meu desejo de visitar a parte de roupas íntimas. Acho que por enquanto vou me virar com o que tenho. Depois sigo Joseph para a área perto da farmácia, onde ficam as vitaminas, remédios para resfriado, pastas de dente, essas coisas. 
Vamos direto para a gôndola dos aparelhos e cremes de barbear. 
— Não faço a barba há uma semana - Joseph diz, esfregando o princípio de barba que está crescendo em seu rosto há alguns dias. 
Acho sexy, mas ele fica sexy com ou sem barba, por isso não reclamo. 
E por que eu reclamaria? 
Pego uma embalagem de aparelhos de barbear também, e um tubo dourado de creme de depilação. Na gôndola seguinte, pego um vidro pequeno de enxaguante bucal, porque enxaguante bucal nunca é demais. Ajeito minha bolsa no outro ombro quando os itens começam a lotar o meu braço. Passamos por mais uma gôndola e eu pego xampu e condicionador da prateleira, tentando equilibrá-los junto com as outras coisas, mas Joseph tira os frascos da minha mão e os carrega. Ele pega o enxaguante bucal também. 
Vamos para a parte dos medicamentos, onde um casal de meia-idade está parado na frente dos xaropes para tosse, lendo os rótulos. 
Joseph diz casualmente, sem baixar a voz: — Amor, você achou o remédio pra candidíase? 
Arregalo os olhos e fico imóvel na frente do Tylenol. 
Joseph pega uma caixinha de Advil da prateleira. 
O casal finge que não ouviu o que ele disse, mas sei que eles escutaram. 
— Mas você tem certeza que tá coçando por causa disso? - ele continua, e o calor no meu rosto está literalmente me derretendo. 
Desta vez, o casal olha discretamente. 
Joseph sorri feito um babaca do outro lado, fingindo ler os rótulos. 
Quero esmurrá-lo, mas em vez disso, entro na brincadeira. 
— Achei sim, querido - respondo tão casualmente quanto ele. — E você? Perguntou se eles têm camisinha tamanho PP? 
A mulher vira a cabeça e olha diretamente para ele, de alto a baixo, e depois para mim, antes de voltar a ler o rótulo. 
Joseph não se abala; por alguma razão, eu sabia que ele não se abalaria. Apenas sorri para mim, adorando cada segundo. 
— É tudo um tamanho só, amor - retruca. — Já falei que vai servir melhor quando você conseguir deixá-lo duro de verdade. 
Um barulho de cuspir escapa dos meus lábios, seguido por uma gargalhada. 
O casal se afasta da gôndola. 
— Você é tão mau! - sussurro para ele entre os dentes, ainda rindo. O tubo de creme de depilação cai ruidosamente do meu braço e me abaixo para pegar. 
— Você também não é tão inocente. 
Joseph pega uma bisnaga de pomada antibiótica com a mesma mão do Advil e vamos para o caixa. Ele joga dois pacotes de stick de carne-seca e uma caixinha de Tic Tac sobre a esteira da caixa registradora. Pego um frasco de antisséptico para as mãos, um tubinho de manteiga de cacau e um pacote de stick de carne para mim.
— Tá ficando corajosa, hein? - Joseph diz sobre o stick. 
Sorrio para ele e ponho o separador de compras de plástico cinza entre as coisas dele e as minhas. 
— Não - respondo. — Adoro stick de carne-seca. Se fosse radioativa, eu comeria mesmo assim. 
Ele apenas sorri, mas depois tenta dizer à caixa que as coisas dele e as minhas estão “juntas”, ao tirar o cartão de crédito da carteira. 
— Não, de novo não - discuto, apoiando o braço na esteira perto do separador de compras. Olho para a caixa e balanço a cabeça, desafiando-a a somar minhas compras com as dele. 
— Eu pago as minhas - sus olhos vêm e vão entre mim e Joseph rapidamente, como se ela estivesse esperando uma réplica. 
Quando ele começa a discutir, viro o queixo com expressão séria e digo: — Eu pago minhas coisas e acabou. Conforme-se. 
Ele meio que revira os olhos e desiste, passando o cartão na maquininha. 
Quando voltamos para o carro, Joseph abre um dos seus pacotes de stick de carne-seca e põe um pedaço na boca. 
— Tem certeza que não quer que eu dirija um pouco? - pergunto. 
Ele balança a cabeça, mastigando com força o stick. 
— Vamos parar em outro motel e pernoitar. 
Ele engole, põe mais um pedaço na boca, engata a marcha e vamos embora. Encontramos um motel a alguns quilômetros da cidade, pegamos as compras e levamos para nossos quartos lado a lado. Este tem um carpete xadrez verde com cortinas pesadas combinando, no mesmo tom verde-escuro, e uma colcha floral da mesma cor. 
Ligo a televisão imediatamente, só para dar um pouco de luz e animação à atmosfera sombria e melancólica. 
Joseph pagou os quartos de novo, usando como desculpa o fato de eu ter “ganhado a parada” com minhas compras no Walmart. 
Ele verifica o quarto primeiro, como da última vez, e depois desaba na espreguiçadeira perto da janela. 
Largo minhas coisas no chão, arranco a colcha da cama e a jogo num canto, perto da parede. — Tem alguma coisa nela? - Joseph pergunta, se refestelando na espreguiçadeira e esticando as pernas. 
Ele parece exausto.
— Não, é que eu tenho medo dessas coisas - me sento na cama e jogo longe meus chinelos, erguendo as pernas e cruzando-as, como na ioga. Coloco as mãos no colo porque ainda estou usando o shortinho branco e me sinto um pouco exposta demais assim, de joelhos abertos. — Você falou como você não sabia pra onde tava indo - Joseph diz. 
Olho para cima e levo um segundo para entender do que ele está falando, do motivo que dei no carro para não ter trazido muita roupa. Ele junta os dedos, apoiando as mãos abertas na barriga. 
Levo um momento para responder, embora a resposta seja vaga: — É, eu não sabia. 
Joseph ergue as costas da poltrona e se curva para a frente, apoiando os braços nas coxas, com as mãos abaixo dos joelhos. Ele inclina a cabeça, me olhando de lado. Sei que vamos ter uma daquelas conversas em que não consigo prever se vou aceitar ou me esquivar de suas perguntas. Tudo depende do quanto ele for bom em tirar as respostas de mim. 
— Não sou especialista nessas coisas - ele começa. — Mas não vejo você partindo sozinha desse jeito, de ônibus, ainda por cima, com uma bolsa, uma malinha e nenhuma ideia do seu destino, só porque sua melhor amiga te apunhalou pelas costas. 
Ele tem razão. Não fui embora por causa de Selena, nem de Damon; eles só faziam parte do contexto. 
— Não, não foi por causa dela. 
— Por que foi, então? 
Não quero falar disso, pelo menos acho que não quero. Parte de mim sente que posso contar qualquer coisa para Joseph, e eu meio que quero contar, mas outra parte está me mandando tomar cuidado. Não esqueci que os problemas de Joseph são mais graves que os meus, e me sentiria idiota, chorona e egoísta contando qualquer coisa para ele. 
Olho para a TV em vez de olhar para Joseph, e finjo estar levemente interessada. 
Ele fica de pé. 
— Deve ter sido alguma coisa bem grave - insiste, se aproximando. — E quero que você me conte. 
Bem grave? Que legal, agora ele complicou a situação, mesmo se eu contasse, pelo menos antes não achava que ele esperava ouvir algo terrível. Agora que sei que ele espera, sinto que deveria inventar alguma coisa.
Não invento, é claro. 
Sinto a cama se mexer quando Joseph se senta ao meu lado. Ainda não consigo olhar para ele. meus olhos continuam grudados na TV. Meu estômago está revirado pela culpa e também por alguma outra coisa, um formigamento, quando penso no quanto ele está próximo. Mas sobretudo pela culpa. 
— Já deixei você ficar sem me contar nada faz um bom tempo - Joseph argumenta. 
Ele apoia os cotovelos nas coxas de novo e se senta como havia se sentado na espreguiçadeira, com as mãos unidas no meio das pernas. — Uma hora você precisa me contar. 
Olho para ele e digo:
 — Não é nada comparado com o que você tá passando - e paro por aí, me virando para a TV de novo. — Por favor, não pergunta mais nada, Joseph. Contar é o que eu mais quero, porque de alguma forma sei que você vai conseguir entender tudo, que você pode resolver tudo.
— Você tá comparando? - ele diz, despertando minha curiosidade. — Então você acha que, como meu pai tá morrendo, os motivos que levaram você a fazer o que fez não são importantes? - ele fala como se essa simples ideia já fosse absurda. 
— Isso mesmo - digo. — Exatamente o que eu acho.
Suas sobrancelhas se juntam e ele olha um pouco para a TV antes de se virar para mim. 
— Bom, isso é uma puta babaquice - afirma com convicção. 
Viro a cabeça bruscamente. 
Ele continua: 
— Sabe, sempre detestei esta frase: Tem gente em situação pior que a sua,  se você encarar como uma competição, claro, é sempre melhor viver de seguro desemprego do que ficar cego, mas não é um concurso, caralho. Certo? 
Ele está me perguntando porque quer saber o que eu acho? Ou é o jeito dele de me dizer como as coisas são, esperando que eu entenda? 
Apenas balanço a cabeça. 
— Dor é dor, gata - cada vez que Joseph me chama de “gata”, presto mais atenção nisso do que em qualquer outra coisa que ele diz. — Só porque o problema de uma pessoa é menos traumático que o de outra, não significa que deva doer menos. 
Acho que é um bom argumento, mas me sinto egoísta mesmo assim. Joseph toca o meu pulso e eu olho para ele, para o modo como seus dedos másculos se fecham sobre o osso na base da minha mão. Quero beijá-lo, a vontade dentro de mim chegou à superfície, mas engulo em seco e a forço para o fundo do meu estômago, que está tremendo por conta própria há vários segundos. 
Tiro minha mão e me levanto da cama. 
— Demi, olha, eu não quis dizer nada com isso. Só tava tentando... 
— Eu sei - murmuro, cruzando os braços e ficando de costas para ele. Com certeza é um daqueles momentos “não é você, sou eu”, mas não vou jogar esse chavão no colo dele. 
Sinto que ele fica de pé, e então me viro devagar e o vejo pegando suas mochilas e o violão encostado na parede. 
Ele vai até a porta. 
Quero segurá-lo aqui, mas não consigo. 
— Vou te deixar dormir um pouco - ele diz baixinho. 
Balanço a cabeça, mas não digo nada, porque temo que, se eu falar, minha mente vai trair minha boca e vou me afundar mais ainda nesta situação perigosa com Joseph, que está ficando mais evidente a cada dia que passamos juntos.

Será que a Demi irá se abrir com o Joseph? Adorei a parte da farmácia hahaha
O que acharam? Comentem!!!
Bjs lindonas <3

25/06/2016

certain love: capítulo 14


A caminho de
Owasso, Oklahoma

Isso que eu chamo de frustração sexual matutina. Tudo bem, vou ter que pegar leve, senão ela vai começar a achar que eu estou aqui de bobeira para tentar me dar bem. Se fosse em outra época, com outra garota qualquer, eu já estaria levantando da cama para jogar a camisinha na privada, mas com Demi é diferente. É duro, mas vou ter que tentar parar de paquerá-la. Esta é uma viagem importante para nós dois. Só tenho uma chance de fazer isso certo, e não quero fazer merda nem fodendo. 
— Então, o que vem a seguir na nossa viagem espontânea? - ela pergunta.
— Primeiro o café da manhã - explico, pegando minhas mochilas do chão. — Mas acho que não seria espontânea se eu tivesse um plano. 
Ela pega o celular da mesa ao lado da cama, verifica se tem novas mensagens de texto e ligações e depois o joga na bolsa. 
Saímos. 
Eis que surge a Demi teimosa e reclamona: — Por favor, Joseph; não consigo comer nesses lugares - ela diz do banco do passageiro. 
A cidade é pequena, e quase todos os restaurantes são de fast-food ou ainda estão fechados. — Tô falando sério - ela insiste, fazendo um bico tão bonitinho que quero segurar seu rosto com as duas mãos e lambê-lo, só para ela gritar e fingir que é a coisa mais nojenta do mundo. — A menos que você queira uma companheira de viagem irritante, com uma hora de enjoo, dor de estômago e gemidos, não me faça comer esses troços, especialmente de manhã tão cedo. 
Jogo a cabeça para trás e aperto os lábios, olhando para ela. 
— Você tá exagerando, vai. 
Começo a achar que ela não está. 
Demi balança a cabeça, apoia o cotovelo na porta do carro e o polegar nos dentes da frente. 
— Não, é sério toda vez que como fast-food, eu passo mal. Não tô tentando dificultar tua vida, pode acreditar; é um problema sempre que vou pra qualquer lugar com a minha mãe ou com a Selena. Elas precisam ficar dando voltas pra achar um lugar pra comer que não vai me deixar na pior. 
Bom, então ela está dizendo a verdade. 
— Tudo bem, com certeza não quero que você passe mal - rio baixinho. — Então vamos rodar um pouco mais e procurar outra coisa no caminho. Vão ter mais lugares abertos daqui a umas horas.
— Obrigada - ela sorri com doçura. 
Disponha sempre...
Duas horas e meia depois, estamos em Owasso, Oklahoma. 
Demi olha para o grande logotipo amarelo e preto da Waffle House, tão conhecido por todos os americanos, e acho que ela está decidindo se quer comer ali ou não. 
— Na verdade, só tem um lugar bom mesmo pra tomar café da manhã - explico, parando numa vaga. — Especialmente no Sul. Tem uma Waffle House em cada esquina por aqui, que nem a Starbucks lá no Norte. 
Ela faz que sim. 
— Acho que eu consigo encarar... tem salada lá? 
— Olha só, eu concordei em não te obrigar a comer uma porcaria gordurosa - inclino a cabeça para o lado e viro o corpo no assento. — Mas salada já é demais. 
Ela faz um bico, morde a bochecha por dentro e finalmente diz, balançando a cabeça: — Tá, não vou comer salada, mas saiba que uma salada pode ter frango e um monte de coisas gostosas, que alguém como você provavelmente nem considerou. 
— Não. Portanto, desista - afirmo resolutamente, e depois jogo a cabeça para trás, devagar. — Vamos lá, já esperei demais pra comer. Tô morrendo de fome. E fico mal-humorado quando tô com fome. 
— Você já é mal-humorado - ela resmunga. 
Eu a seguro pelo braço e a puxo para perto de mim. Ela tenta esconder o rosto, que está ficando vermelho. 
Adoro o cheiro da Waffle Hous, é o cheiro da liberdade, de estar na estrada e saber que 90% das pessoas comendo ao seu redor também estão. Motoristas de caminhão, mochileiros, bebuns, aqueles que não levam a vida monótona e escravizada da sociedade. O restaurante está quase cheio. Demi e eu conseguimos uma mesa perto do grill e o mais longe possível das altas vidraças. Há uma jukebox obrigatória, um símbolo da cultura das Waffle Houses, perto de uma daquelas janelas. 
A garçonete nos recebe com um sorriso, um bloco de anotações numa mão e uma caneta pronta para escrever, com a ponta apoiada no papel. 
— Posso trazer café pra vocês? 
Olho para Demi, que já está correndo os olhos pelo cardápio sobre a mesa. 
— Vou tomar um chá doce - ela diz.
A garçonete anota e olha de novo para mim. 
— Café.
Ela balança a cabeça e vai preparar nossas bebidas. 
— Parece que tem umas coisas boas aqui - Demi comenta, olhando o cardápio com uma bochecha apoiada na mão fechada. Seu dedo indicador corre pelo plástico e para na pequena seção das saladas. — Viu? Olha só - ela olha para mim. — Tem salada de frango grelhado e salada de frango com maçã e noz-pecã. 
Não resisto a esse olhar esperançoso dela. 
Eu entrego os pontos. Totalmente. 
— Pode pedir o que quiser - autorizo, com uma expressão de ternura. — Sério, não vou reclamar. 
Demi pisca duas vezes, um pouco atordoada por eu ter cedido tão facilmente, e então seus olhos parecem sorrir para mim. Ela fecha o cardápio e o coloca no suporte sobre a mesa enquanto a garçonete volta com nossas bebidas. 
— Vão pedir agora? - ela pergunta, depois de deixar as bebidas na nossa frente. A ponta de sua caneta, como se nunca saísse do lugar, ainda está encostada no bloco, pronta para ser usada. 
— Vou querer a omelete fiesta - Demi diz, e vejo um sorrisinho em seu rosto quando ela me olha. 
— Com torradas ou pão? - a garçonete pergunta. 
— Pão. 
— Com creme de milho, batata ou tomate? 
— Batata. 
A garçonete termina de anotar o pedido de Demi e se vira para mim. 
Penso por um segundo e então digo: 
— Vou querer a salada de frango com maçã e noz-pecã. 
O sorriso de Demi desaparece imediatamente e seu rosto fica imóvel. Pisco para ela e guardo o cardápio no mesmo suporte. 
— Tá vivendo perigosamente, hein? - a garçonete brinca. 
Ela arranca a primeira folha do bloquinho. 
— Só por hoje - respondo, e ela balança a cabeça e vai embora. 
— Que porra...? - Demi diz, estendendo as mãos com as palmas para cima. Ela não consegue decidir se deve sorrir ou me olhar, sem graça, então acaba fazendo um pouco dos dois. 
— Acho que se você tá disposta a comer uma coisa só por minha causa, posso fazer o mesmo por você. 
— Ah, é? Mas acho que essa salada não vai ser suficiente pra você. 
— E eu acho que você tá certa - concordo. — Mas o que é justo é justo. 
Ela faz uma cara levemente incrédula e se recosta no banco. 
— Não vai ser tão justo se eu tiver que ficar ouvindo você reclamar que tá com fome quando a gente voltar pra estrada. Você mesmo disse que a fome te deixa de mau humor.
Não consigo realmente ficar de mau humor com Demi, mas ela tem razão: a salada não vai bastar para mim. E alface me dá gases, com certeza ela vai odiar viajar comigo se eu comer essa porra. Mas eu consigo. Só espero conseguir comer tudo sem me entregar, deixando escapar alguma das mil reclamações que já estão na ponta da minha língua. 
Isso vai ser interessante. 
Alguns minutos depois, a garçonete traz a comida de Demi e põe meu prato de blasfêmia diante de mim. Ela reabastece nossas bebidas, pergunta se precisamos de mais alguma coisa e volta a atender os outros clientes. 
Demi já está me examinando. 
Ela olha para o seu prato, põe o pão do lado oposto das batatas e gira o prato, segurando a borda, para deixar a omelete ao seu alcance. Eu pego o garfo e mexo um pouco na salada, fingindo, como Demi, que a estou preparando. 
Nós nos entreolhamos e ficamos em silêncio, cada um esperando que o outro diga alguma coisa. Ela franze os lábios. Eu também. 
— Quer trocar? - ela pergunta. 
— Quero - aceito sem hesitação, e deslizamos os pratos sobre a mesa um para o outro. 
O alívio se espalha nos nossos rostos. 
Não é o prato que eu pediria, mas é melhor que alface. 
Na metade da refeição bem, na metade para ela eu já terminei a minha, peço uma fatia de torta de chocolate e mais café. E ficamos falando da ex-melhor amiga dela, Selena, e de como essa Selena é uma espalhafatosa com peitões. Ao menos é isso que estou entendendo, pela descrição que Demi faz dela. 
— E o que aconteceu depois do incidente no banheiro? - pergunto, mordendo minha torta.
— Nunca mais entrei num banheiro público com ela depois disso - Demi conclui. — Aquela garota não tem vergonha na cara. 
— Ela parece divertida - comento. 
Demi parece pensativa. 
— Ela era. 
Eu a estudo discretamente. Está perdida em alguma lembrança, cutucando o último pedaço de frango de sua salada com o garfo. Meu garfo tilinta contra o prato quando tomo uma decisão e o solto. Limpo a boca com o guardanapo e me levanto. 
— Aonde você vai? - ela olha para mim. 
Apenas sorrio e vou até a jukebox perto da janela. Enfio uma moeda e corro os olhos pelos títulos, finalmente escolhendo uma canção e apertando os botões. Raisins In My Toast, um dos clássicos presentes em todas as jukeboxes de todas as Waffle Houses, começa a tocar enquanto estou voltando. 
As três garçonetes e o cozinheiro me fuzilam com olhares implacáveis. Eu simplesmente sorrio. 
O corpo todo de Demi está travado no lugar. Suas costas estão rígidas, o branco dos seus olhos brilha para mim, e quando começo a mexer a boca formando a letra da canção estilo anos 50, ela afunda muito no assento, com o rosto vermelho como nunca vi. 
Volto para o meu lugar, mexendo os quadris enquanto me sento. 
— Ai meu Deus, Joseph, por favor, não canta isso também!
Estou me esforçando ao máximo para não rir, mas canto a letra da música com um sorriso gigante grudado na cara. Demi cobre o rosto com as mãos, e seus ombros, cobertos pela fina blusa branca, sobem e descem enquanto ela reprime as gargalhadas. 
Estalo os dedos no ritmo da música como se eu estivesse usando brilhantina, e quando começa a voz aguda, eu a imito, com a cara toda contorcida por uma emoção exagerada.
E canto as notas mais graves também, apoiando o queixo no peito com a expressão bem séria. Não paro de estalar os dedos. Quanto mais a canção avança, com mais emoção eu canto. No meio dela, Demi não consegue mais se segurar. Ri tanto sem abrir a boca que seus olhos ficam cheios d’água. 
Ela já afundou tanto no assento, a essa altura, que seu queixo está quase encostando na mesa. 
Quando a canção termina, para alívio dos funcionários, recebo as palmas solitárias da senhora sentada à mesa atrás de Demi. Ninguém mais liga, mas, pela expressão de Demi, é como se todos no restaurante estivessem olhando e rindo de nós. Hilariante. E ela fica tão lindinha quando está constrangida. 
Apoio os cotovelos na mesa e estendo os braços por cima do tampo, juntando as mãos. 
— Ah, até que não foi tão ruim, foi? - provoco com um sorrisinho. 
Demi passa a ponta do dedo sob os dois olhos para limpar o borrão preto que ela sabe instintivamente que se formou. Mais algumas risadas ainda agitam seu peito antes que se acalme. 
— Você também não tem vergonha na cara - ela diz, rindo mais uma vez. 
— Foi constrangedor, mas acho que eu tava precisando disso - Demi tira os sapatos e põe os pés sobre o banco da frente do carro. 
Estamos na estrada de novo, seguindo apenas a orientação do dedo de Demi. 
Seguimos para o leste na 44 pelo jeito, vamos atravessar a parte de baixo do Missouri. 
— Fico feliz em poder ajudar. 
Estico o braço e ligo o som. 
— Ah, não - ela provoca. — Pra que momento distante dos anos 70 será que vamos voltar desta vez? 
Inclino a cabeça e sorrio para ela. 
— Esta música é legal - defendo, aumentando um pouco o volume e tamborilando com os polegares no volante. 
— É, já conheço - ela admite, apoiando a cabeça no encosto. — Wayward Son. 
— Quase isso - digo. — Carry On Wayward Son. 
— Se tava quase certo, não precisava me corrigir - ela finge estar ofendida, mas não convence muito. 
— E de que banda é? - pergunto para testá-la. 
Ela faz uma careta para mim. 
— Não sei! 
— Kansas - eu conto, com uma sobrancelha intelectualmente levantada. — Uma das minhas favoritas. 
— Você diz isso de todas - ela franze os lábios e pisca algumas vezes. 
— Pode ser - confesso. — Mas, na real, as músicas do Kansas têm muita emoção. Dust in the Wind, por exemplo não consigo pensar numa música mais adequada pra morte. Porque de algum jeito, ela me faz parar de ter medo de morrer. 
— Parar de ter medo de morrer? - Demi exclama, incrédula. 
— É, acho que sim. É como se Steve Walsh fosse o Ceifador, e estivesse te dizendo que não há o que temer. Cacete, se eu pudesse escolher uma música pra ouvir na hora da morte, essa seria a primeira da playlist. 
Demi parece desanimada. 
— Isso é um pouco mórbido demais pra mim. 
— Se você encarar desse jeito, acho que é. 
Ela está virada para mim, agora, com as duas pernas sobre o assento, os joelhos dobrados, e o ombro e a cabeça encostados no banco. Com aquela trança dourada que a faz parecer tão mais suave sempre jogada sobre o ombro direito. 
— Hotel California - diz. — Eagles. 
Olho para ela. 
Estou impressionado. 
— Esse é um clássico que eu gosto. 
Isso me faz sorrir. 
— É mesmo? Essa canção é ótima, de arrepiar... me faz meio que sentir que tô num daqueles velhos filmes de terror em preto e branco. Boa escolha. 
Estou muito impressionado, na verdade. 
Tamborilo com os polegares mais um pouco no volante acompanhando Carry On Wayward Son, e então ouço um pou! alto e um flap-flap-flap-flop-flap-flop constante, até que eu desvio lentamente para o lado e paro no acostamento. 
Demi já apoiou novamente os pés descalços no assoalho do carro e está olhando em volta, tentando descobrir de onde veio o barulho. 
— O pneu furou? - ela pergunta, mas é mais como se dissesse: “Que legal, o pneu furou!”
 — Furou - respondo, pondo o câmbio em park e desligando o motor. — Ainda bem que tem um estepe no porta-malas. 
— É um daqueles mini pneus feios? 
Eu rio. 
— Não, tenho um pneu em tamanho natural lá dentro, com roda e tudo, e te garanto que vai ficar igualzinho aos outros três.
Ela parece um pouco aliviada, até que percebe que estou gozando com a sua cara, e então mostra a língua e fica vesga para mim. Não sei por que isso me dá vontade de transar com ela no banco de trás, mas cada louco com suas manias, acho. 
Ponho a mão na maçaneta e ela volta a dobrar as pernas sobre o banco. 
— Por que você tá ficando toda confortável aí? 
Ela pisca. 
— Como assim? 
— Calça os sapatos - digo, acenando para eles no assoalho do carro. — Levanta essa bunda daí e vem me ajudar. 
Ela arregala os olhos e fica parada, como que esperando que eu ria e diga que estou só brincando. 
— Eu-eu não sei trocar pneu - ela diz, ao perceber que não é brincadeira.
— Você sabe trocar pneu - corrijo, e isso a deixa ainda mais atordoada. — Já viu como se faz milhares de vezes ao vivo e nos filmes, pode acreditar, você sabe, todo mundo sabe. 
— Nunca troquei um pneu na minha vida - ela só falta fazer beicinho. 
— Bom, hoje você vai trocar - digo sorrindo, abrindo minha porta só alguns centímetros para que uma carreta que se aproxima não a arranque. 
Depois de mais alguns segundos de incredulidade, Demi enfia os pés nos tênis e fecha a porta do carro atrás de si. 
— Vem cá - faço um gesto para ela, que me acompanha até a traseira do carro. 
Aponto para o pneu furado, o traseiro direito. — Se fosse um dos pneus do lado da estrada, você iria se livrar dessa. 
— Vai mesmo me fazer trocar um pneu? 
Achei que já tivéssemos resolvido isso. 
— Sim, gata, vou mesmo fazer você trocar um pneu.
— Mas no carro você disse que eu iria ajudar, não fazer todo o trabalho. 
Balanço a cabeça. 
— Bom, tecnicamente, você vai me ajudar, mas... vem cá de uma vez. 
Ela dá a volta no porta-malas, eu tiro o estepe de dentro e apoio no asfalto. 
— Agora pega o macaco e a chave de roda no porta-malas e traz aqui. 
Demi faz o que eu mando, resmungando baixinho alguma coisa sobre sujar as
mãos com a “nhaca preta”. Controlo minha intensa vontade de rir dela enquanto rolo o pneu para perto do furado e o deito ao lado. Mais uma carreta passa velozmente, o vento balança um pouco o carro. 
— Isto é perigoso - ela reclama, largando o macaco e a chave de roda aos meus pés. 
— E se um carro sair da estrada e atropelar a gente? Você não vê os vídeos incríveis? 
Puta merda! Ela também assiste? 
— Na verdade, vejo, sim - digo. — Agora vem cá e vamos fazer isso logo. Se for você que estiver agachada, escondida do trânsito pelo carro, vai ser menos provável que alguém atropele a gente. 
— Por que menos provável? - ela franze as sobrancelhas. 
— Bom, se você estivesse de pé, toda sexy e tal, acho que eu também iria ficar olhando pra você e sair da estrada. 
Demi revira os olhos exageradamente e se curva para pegar a chave de roda. 
— Ui! - ela grunhe, tentando afrouxar as porcas. — Tá apertado demais, cacete! 
Afrouxo para ela, mas deixo que termine de desatarraxar as porcas, mantendo os olhos no trânsito sem deixar transparecer que estou ficando nervoso. Se eu estiver vigiando, fica mais fácil agarrá-la e sairmos do caminho do que se fosse ela de olho nos carros. 
A seguir vem o macaco eu a ajudo, mostrando como girar para abri-lo e qual o melhor lugar para fixá-lo, mas até que isso ela já parecia saber sem minha ajuda. A princípio ela se atrapalha com a manivela, mas pega o jeito rapidamente e levanta um pouco o carro. 
Dou uma manjada na bunda dela porque eu seria um idiota, ou gay, se não fizesse isso.
E então, do nada, sem nem sombra de um relâmpago para avisar, começa a chover como se alguém tivesse aberto uma torneira no céu. 
Demi grita que está ficando encharcada e isso a distrai do pneu completamente. Ela se levanta num salto e começa a correr para a porta do carro, mas para quando se dá conta de que não deve entrar no carro levantado pelo macaco.
 — Joseph! - ela está completamente encharcada, com as mãos na cabeça, como se isso realmente fosse ajudá-la a se proteger da chuva. 
Eu estou rolando de rir.
— Joseph!
Ela está ridiculamente furiosa.
Eu a seguro pelos ombros e digo, com a chuva batendo no meu rosto: — Eu termino de trocar o pneu - é difícil ficar sério. E eu não fico. 
Em poucos minutos, o estepe está aparafusado e eu jogo o pneu furado, junto com o macaco e a chave de roda, no porta-malas. 
— Peraí! - digo, quando Demi faz menção de entrar no carro, agora que é seguro. 
Ela para. Está tremendo na chuva, seu corpo todo encharcado. Bato a tampa do porta-malas e me aproximo dela, sentindo meus pés chafurdando na água dentro dos tênis porque não estou usando meias, e sorrio para ela, esperando que ela sorria também. 
— É só chuva. 
Ela cede um pouquinho, sem dúvida buscando mais brincadeiras de encorajamento da minha parte. 
— Vem cá. - estendo a mão e ela a segura. 
— Que é? - pergunta timidamente. 
Sua trança está pesada com a água, os poucos fios macios sempre ao redor do seu rosto estão grudados na testa e de um lado do pescoço. Eu a levo para o porta malas e subo nele. Ela fica ali, com a chuva escorrendo continuamente pelo seu corpo. Estendo a mão de novo, e com hesitação Demi a toma e eu a puxo para cima da traseira do carro. Ela sobe no teto comigo, o tempo todo me olhando como se eu fosse um louco irresistível. 
— Deita - digo por cima do barulho alto da chuva torrencial, deitando de costas no teto, com os pés em cima do para-brisa. 
Sem questionar ou protestar, embora ambas as coisas estejam meio que escritas no seu semblante, ela se deita ao meu lado. 
— Isto é loucura! - grita. — Você é louco. 
Ela deve gostar de loucos, porque começo a sentir que quer estar ali em cima comigo. Descartando aquele meu plano inicial, que diz que preciso me controlar quando estou perto dela, estendo meu braço esquerdo, e ela instintivamente deita a cabeça nele. 
Engulo em seco. Não esperava mesmo isso. Mas fico feliz que ela tenha feito. 
— Agora abre os olhos e olha pra cima - falo, eu mesmo já olhando para o céu.
Um caminhão menor passa rapidamente, seguido por alguns carros, mas nós nem notamos. Mais uma carreta passa e o vento balança um pouco o carro, mas também não damos importância a isso. 
De início, ela faz caretas quando a chuva entra em seus olhos, mas obedece, de vez em quando piscando e tentando esconder o rosto no meu peito para protegê-lo da chuva, o tempo todo rindo baixinho. Ela se obriga a olhar diretamente para cima, mas desta vez fecha os olhos e deixa a boca entreaberta. Olho para seus lábios, para a chuva que escorre em fios sobre eles, para seus sorrisos e sobressaltos quando os pingos entram na sua garganta. Para seus ombros que se erguem quando ela tenta esconder o rosto, sorrindo e gargalhando, ensopada. 
Olho tanto para ela que esqueço completamente que está chovendo. 

E esse final? Lindo :(
Gostaram? Comentem, bjs lindonas <3